Alguém, nalgum lugar, está a escrever uma nova versão do livro “World Out of Balance”, de 2008, de Brooks e Wohlforth. Argumentavam os autores que as quatro restrições externas à política de segurança dos EUA – instituições internacionais, interdependência económica, legitimidade e equilíbrio – não se aplicavam devido à natureza unipolar da economia mundial.
E mais sustentavam que os EUA não estavam em vias de perder a sua situação de supremacia e que tinham 20 anos para redesenhar a ordem internacional. Não foi esta a história dos últimos dez anos e dificilmente podemos ver o mundo de hoje como unipolar.
Um sinal do fim desta supremacia é precisamente o que se passa na Ucrânia e no Médio Oriente, com o alastrar dos conflitos armados. Como dizia Edwin Starr na sua grande música de 1970 (melhor que a versão de 1969 dos Temptations), “war, what is it good for? Absolutely nothing”. Mas, no caso, a guerra serve para acelerar e marcar o caminho de mudança da ordem internacional, e destronar uns EUA que a diplomacia de Trump (a falta dela) isolou e fragilizou.
Passámos do War de Bob Marley (artista que a ONU condecorou com a Medalha de Paz do Terceiro Mundo), cuja letra é em grande parte um discurso de Selassie na ONU, contra a discriminação racial e como ela levou à guerra, ao War de Starr, que trata só da guerra em si e está no Grammy Hall of Fame (há uma cover version dos Ugly Rumours, a banda de Tony Blair na Universidade). Da guerra por princípios à guerra pelo poder.
Este estado de coisas só pode piorar se Trump ganhar as eleições. Para já, Biden está com vantagem, embora dizer que é pequena é exagero (0,3% ao dia de hoje, no 270towin.com). Mas não deixa de ser curioso como Trump usa as eleições para fazer dinheiro – a fazer publicidade à venda de sapatilhas de ténis, perfumes, velas e agora, pasme-se, Bíblias, a 60 dólares cada.
O mesmo Trump que o “New York Times” revela que, com mais de 90 acusações a correr contra si nos tribunais americanos, já gastou mais de 107 milhões de dólares em custas judiciais sem pagar um tostão do seu bolso: todos os seus custos de consultoria jurídica e de patrocínio foram pagos por donativos às suas campanhas, a começar na para reverter o resultado das eleições de 2020, através nomeadamente da estrutura de political action committees que criou.
Depois disto, vender Bíblias – que sustenta não ter nada a ver com eleições – é coisa banal. Mas permite pensar que a presidência é para ele mais um negócio. Não é para nós.