Muito se fala na necessidade de reter talento em Portugal e nas dificuldades que as empresas enfrentam para o conseguir. Esta acentuada escassez de recursos humanos qualificados é um problema que também afeta outros países europeus, mas que se faz sentir de forma muito intensa na nossa economia devido à nossa incapacidade para competir em termos de atratividade salarial com países economicamente mais desenvolvidos.

O Governo lançou recentemente algumas medidas para inverter este ciclo negativo, tentando atrair e reter os mais jovens com incentivos fiscais (redução de IRS) e apoios à compra de habitação (isenção de IMT e imposto de selo).

São medidas importantes, mas devemos ir mais fundo e perceber o que motiva os jovens a sair, para podermos ser realmente eficazes nas medidas que implementamos. Nos diversos inquéritos realizados junto das empresas em Portugal, fica patente o problema da escassez de recursos humanos como um dos principais fatores de preocupação para gestores e empresários.

Mas quais são as principais razões para este fenómeno?

Um saldo de natalidade muito baixo nas últimas décadas, associado a uma emigração significativa dos mais jovens e também ao desajuste entre as necessidades específicas das empresas e as qualificações dos profissionais disponíveis no mercado de trabalho. A digitalização e a transição para uma economia neutra em carbono provocam ao mesmo tempo a criação e destruição de empregos, o que obriga a uma requalificação bastante mais rápida do que aquela a que a sociedade se habituou no passado.

Como exemplo, basta olhar para os profissionais nas áreas tecnológicas, onde a necessidade do mercado excede em muito o número de profissionais disponíveis, uma situação parcialmente mitigada pela absorção de imigrantes qualificados que chegam ao nosso país nos últimos anos.

Se olharmos para os anos mais recentes e usarmos 2021 como exemplo, verificamos que, dos 70 mil portugueses que emigraram nesse ano, 70% eram jovens entre 15 e 39 anos, muitos dos quais com qualificação superior (segundo dados do INE, 48% dos emigrantes de 2021 haviam completado o ensino superior).

“Com o aumento de custo de vida associado a altas taxas de IRS e a facilidade de obter emprego bem remunerado no mercado europeu é mais atrativo um emprego num país a três horas de distância por avião com o dobro ou o triplo do rendimento disponível.”

Uma vez analisado o estado da arte, é necessário pensar em soluções que ataquem o problema e garantam que a nossa economia tenha acesso aos recursos necessários para ser competitiva. A dificuldade em reter talento, aliada às variações negativas na pirâmide etária (devidas à baixa natalidade e ao aumento da longevidade), exerce uma enorme pressão financeira sobre a nossa Segurança Social.

Além das soluções já avançadas pelo Governo, como a redução do IRS e a isenção do IMT, que ajudam a aliviar a carga fiscal muito elevada e a permitir que os jovens possam estabelecer-se nas áreas onde têm acesso ao mercado de trabalho, precisamos de considerar outras medidas, tais como:

  1. Promover um ecossistema que facilite a criação de empresas com maior dimensão capazes de oferecer salários mais atrativos e condições de carreira aliciantes. Empresas de maior dimensão são mais competitivas, pagam melhores salários e oferecem uma melhor perspetiva de carreira;
  2. Estabelecer sistemas de trabalho mais flexíveis que permitam uma melhor relação entre trabalho e vida pessoal, através do teletrabalho, trabalho remoto ou outras práticas alinhadas com as aspirações das novas gerações;
  3. Garantir políticas de retenção que assegurem a permanência dos trabalhadores, fortalecendo uma cultura organizacional participativa a par com uma lógica de meritocracia (a nossa geração mais qualificada de sempre, tem de sentir que na sua organização o esforço é recompensado);
  4. Promover a requalificação dos nossos recursos humanos internos, de forma que profissionais de setores em declínio possam, com a formação adequada, ser realocados para setores em crescimento e de futuro;
  5. Estabelecer uma previsão das necessidades do nosso mercado laboral para o futuro próximo e ajustar os conteúdos e cursos do nosso sistema de ensino superior, sem comprometer a diversidade da formação.

Tenho consciência de que estas medidas não vão resolver de imediato todas as necessidades, sendo por isso essencial manter uma política de acolhimento de imigrantes que satisfaçam as nossas necessidades de mão de obra, garantindo ao mesmo tempo que sejam integrados de forma digna na nossa sociedade.

Contudo, é fundamental lembrar que a inação perante esta situação apenas agravará o problema, impedindo o crescimento económico que desejamos e ameaçando a sustentabilidade da nossa Segurança Social.