É uma utopia pensar que ter pessoas inteligentes numa empresa é condição suficiente para ter sucesso. O mundo é constituído por seres humanos interagindo, quer em família quer social e profissionalmente e, porque somos humanos, somos mentalmente instáveis, falhamos no comportamento e isso afeta o desempenho global da empresa.
Por isso gerir equipas é de uma dificuldade brutal. As empresas têm de produzir bem, criar bem, vender bem, fidelizar clientes, mas tudo isto só é sustentável se as pessoas nas empresas estiverem bem consigo e entre si, em paz, portanto.
Gerir equipas não é mandar, dar ordens, punir ou esclarecer. Gerir equipas é unir e motivar, criando uma sensação de satisfação por estar ali, naquele momento, naquele dia, naquela empresa, com aquelas pessoas. Gerir bem é liderar, é fazer com que todos sintam que aquele dia está a valer a pena. Continuadamente, dia após dia!
Mas a paz entre as pessoas não é um assunto que se decrete ou se regulamente. A paz entre as pessoas começa no interior de cada um e isso é de uma instabilidade terrível.
As palavras que se seguem pretendem explicar esta minha assertividade, ainda que de forma superficial, com base na inteligência humana e no que ela tem de tão extraordinária como de perturbadora.
A inteligência é a capacidade de o ser humano lidar com situações e factos que variam a todo o momento, que dependem de conjunturas, de circunstâncias, de culturas, etc. A inteligência é uma faculdade do ser humano para lidar com complexidades, o que por si só faz da inteligência um fenómeno complexo.
Definir inteligência, ainda hoje, não é uma questão pacífica para muitos especialistas. E, para alargar o espectro desta complexidade, temos também de considerar a inteligência emocional. A grosso modo, a inteligência cognitiva pode ser a faculdade em lidar com factos como a linguagem, o raciocínio, a escrita, enquanto a inteligência emocional está mais relacionada com o comportamento, e este fortemente condicionado pelas emoções.
Portanto, eu dizer que uma determinada pessoa é inteligente é um tiro no escuro e depende do quanto eu me avalio a mim mesmo, isto é, avalia-se a outra pessoa por comparação com o conhecido – nós mesmos.
A perspetiva é muito importante porque toda a realidade que percecionamos é uma realidade que depende da nossa posição logo, uma pessoa será tão mais inteligente ou estúpida em função da forma como nos vemos a nós mesmos. Nos vemos ou nos queremos ver.
Para uma pessoa que se tenha em muito boa conta, o que sucede muito com os narcisistas ou egocêntricos, os outros são habitualmente estúpidos, incapazes, mentecaptos, enfim, menos válidos.
E já agora, estúpido ou inteligente em que aspeto? Cognitivo ou emocional? Ora bem, esta questão do cognitivo ou emocional é muito interessante pelo seguinte. Tomemos o exemplo de uma pessoa muito hábil de raciocínio, muito fluida a verbalizar e com muito conhecimento em discursos de mestria. É habitual que os outros a classifiquem de inteligente e ela própria se sinta inteligente.
Agora imaginemos essa pessoa numa conversa com outras, em interação. Imaginemos uma situação cujas emoções dos protagonistas estão mais vivas que o normal, sobem de tom porque o tema é sensível e o momento de diálogo fica mais intenso.
As pessoas tendem a falar mais alto, a falar umas por cima das outras, tendem a interromperem-se e podem chegar à má educação ou a proferir palavras que deixam mágoa. Já não é uma conversa, é no mínimo uma discussão. Já estamos num ambiente de débil inteligência emocional.
E, imagine-se que a pessoa referida atrás, que fala muito bem, muito culta e com uma fluidez verbal fantástica, a certa altura começa a referir-se aos outros como imbecis, estúpidos, mentirosos ou até “burros”.
Uma pessoa culta, instruída e bem-falante pode tornar-se desagradável, inconveniente e ter um comportamento nada inteligente. Esta baixa inteligência que levou à prática de um comportamento desequilibrado e nada recomendável, é a inteligência emocional. A pessoa não foi, no campo das emoções, suficientemente inteligente para lidar com as circunstâncias, desde logo com a sua própria raiva e ego.
Uma pessoa pode mostrar sinais de inteligência cognitiva, mas, se se perde na confusão das emoções, inteligente não é. Uma pessoa pode ser interessante ao lidar com factos, com informação, com o conhecimento, mas quando lida com emoções pode ser um desastre.
Atualmente, gosto de tomar uma pessoa por inteligente quando “se observa a si mesma” e perceciona o quão construtiva está perante as adversidades e, obviamente, se age sem maldade sobre os outros.
Por tudo isto, aceito que somos capazes de grandes feitos, mas a paz no mundo não é um deles. E quando digo no mundo, sei que ele começa em nós mesmos, na nossa casa, na nossa empresa.
Enquanto não formos capazes de usar a inteligência cognitiva para desenvolver a emocional, nunca seremos capazes de apaziguar as emoções em nós e sem isso é impossível lidar pacificamente com os outros. Haverá sempre algo que nos desestabiliza e nos faz perder o norte.
E ambas as inteligências devem ser desenvolvidas toda a vida, quer para nos sentirmos bem connosco próprios quer pelo equilíbrio que emanamos nas interações com os outros. Isto é verdade em casa, na rua ou na empresa!