Vivemos num contexto onde as exigências profissionais, sociais e pessoais são intensas e como resultado disso tem havido um aumento de problemas relacionados com a saúde mental. Cerca de 10% da população mundial tem algum tipo de perturbação mental e estima-se que 14,3% das mortes que acontecem anualmente estão relacionadas com essas perturbações. Considerando esses números, facilmente se percebe que estamos diante de um problema de saúde pública.

Para tratar desses problemas, comummente se recorre à farmacoterapia e psicoterapia. Todavia, essas formas de tratamento são onerosas para os serviços de saúde e para as pessoas. Isso contribui para que haja uma saúde iníqua para ricos e pobres, porque nem todos têm acesso aos mesmos cuidados. Assim, procurar outras formas de tratamento e até de prevenção, acessíveis a todos, é importante. Atualmente, é reconhecida a importância da atividade física (AF) para a saúde, por isso o número de praticantes recreativos tem aumentado, principalmente por questões relacionadas com problemas físicos ou estéticos. Não obstante, essa mesma atividade também redunda em benefícios para a saúde mental, ajudando igualmente na prevenção de problemas como stresse, ansiedade e depressão.

Atividade física vs. psicoterapia ou farmacoterapia

A relação entre AF, psicoterapia e farmacoterapia no tratamento das perturbações mentais, principalmente a depressão, é um tema de debatido na comunidade científica. Estudos têm examinado a eficácia e os custos associados a essas abordagens, procurando compreender como é que cada uma contribui para a melhoria do estado de saúde mental. Em muitos casos a prática regular de AF é tão eficaz quanto a psicoterapia ou a farmacoterapia.

Tanto a psicoterapia quanto a farmacoterapia são opções valiosas, mas os seus custos financeiros são aspetos críticos. Esses custos podem criar barreiras ao acesso, limitando a disponibilidade dessas opções terapêuticas. Outra consideração importante é a presença de efeitos secundários associados à farmacoterapia, que podem variar em gravidade e impactar negativamente na qualidade de vida. Muitos medicamentos psicotrópicos causam efeitos secundários adversos. Para além desses efeitos, o uso prolongado desses medicamentos pode levar ao desenvolvimento de tolerância, dependência física e síndrome de abstinência ao interromper o tratamento.

Por outro lado, a AF parece uma alternativa promissora. Estudos demonstram os benefícios da AF na redução dos sintomas e no tratamento de muitas perturbações mentais, muitas vezes sem os efeitos colaterais associados à farmacoterapia e sem o risco de dependência. Além disso, a AF oferece benefícios adicionais para a saúde física, como a melhoria da aptidão cardiovascular, a redução do risco de doenças crónicas e o fortalecimento do sistema imunológico.

A ausência de efeitos secundários significativos, juntamente com os benefícios físicos, destaca a atratividade da AF como uma opção terapêutica para o tratamento das perturbações mentais. A sua acessibilidade e custo relativamente baixo também contribuem para a sua viabilidade como uma forma de tratamento.

Quanto se deve praticar?

Existe o princípio de que qualquer AF é melhor que nenhuma atividade. Cada minuto e cada passo contam para promover os benefícios da AF na saúde mental. Por isso, aumentar a frequência de deslocações ativas, realizar tarefas domésticas, ou mesmo passear o animal de estimação, são boas estratégias para o aumentar os níveis de AF e melhoria da saúde mental.

Para compreender a quantidade de AF necessária usam-se os critérios FITT. Os critérios FITT representam: a frequência (número de vezes por semana), a intensidade (leve, moderada ou vigorosa), o tempo (duração de cada sessão) e o tipo (podem ser atividades aeróbicas, exercícios de resistência ou de força). É depois a conjugação dos critérios FITT que dá a dose de AF.

Frequência

Relativamente à frequência, o mais recomendado são 4 a 5 sessões por semana. Menos sessões também trazem benefícios para a saúde mental, mas o seu efeito é menor. A diminuição do efeito é especialmente verdade para frequências inferiores a 3 vezes por semana. A frequência pode ser focada na AF do dia-a-dia (e.g. caminhada, tarefas domésticas). Pelo menos 20 minutos de AF 3 a 5 vezes por semana são suficientes para uma redução moderada do stress psicológico.

Intensidade

AF com intensidade moderada a vigorosa é o mais recomendado. Isso não significa que praticar atividades de intensidade leve não tenha benefícios, apenas que não apresentam resultados tão significativos como aqueles providenciados pelas intensidades moderada e vigorosa. As atividades com intensidade moderada a vigorosa são aquelas em que, durante a sua prática, observa-se uma alteração da frequência respiratória e a respiração torna-se mais ofegante.

Tempo

Sessões com pelo menos 30 minutos são mais eficazes para melhorar a saúde mental do que sessões mais curtas. O tempo é um critério muito importante e, em conjunto com a frequência, permite detalhar o volume de AF. O volume corresponde à combinação da frequência com a duração. Por exemplo, um volume de 100 minutos por semana pode corresponder a 5 sessões de 20 minutos ou a 2 sessões de 50 minutos por semana. Assim, o volume é outra forma de contar o tempo, normalmente semanal. Juntando a frequência com o tempo recomendado, percebe-se que o volume ideal será de pelo menos 120 a 150 minutos por semana. Volumes superiores a 150 minutos por semana trazem benefícios adicionais para a saúde mental. No entanto, esses aumentos em termos de benefícios são relativamente pequenos em comparação com aqueles obtidos com os 120 a 150 minutos por semana.

Tipo

Diferentes tipos de atividades têm efeitos diferentes associados a diferentes objetivos. Por exemplo, nos mais velhos são recomendados exercícios de força e equilíbrio para combater a perda de massa muscular e o risco de quedas; para a prevenção de doenças cardiovasculares são maioritariamente recomendadas atividades aeróbias. No caso da saúde mental, qualquer tipo de atividade é semelhantemente eficaz. Isto significa que cada pessoa pode optar pelo seu tipo preferido de AF. Além disso, exercícios que promovam a integração do movimento com processos cognitivos (e.g. ioga, tai-chi), também parecem ter um efeito importante na melhoria da saúde mental e são uma boa alternativa às AF mais clássicas.

Existe uma dose ótima?

É difícil estabelecer uma dose de AF que garanta efeitos ótimos ao nível da saúde mental. Todavia, combinando os critérios FITT, podemos concluir que praticar qualquer tipo de AF de intensidade moderada a vigorosa 4 a 5 vezes por semana, durante pelo menos 30 minutos, ou, pelo menos 120-150 minutos por semana de AF moderada a vigorosa, traz importantes benefícios à saúde mental.

Embora esta seja a dose recomendada, níveis inferiores e superiores de AF continuam a ter um efeito benéfico na saúde mental. Se for analisado o exemplo da depressão, verifica-se que praticar AF moderada apenas 20 minutos por dia, cinco dias por semana (totalizando 100 minutos por semana), diminui o risco de depressão em 43%. Por outro lado, 2 horas nas mesmas condições (totalizando 600 minutos por semana) diminui o risco de depressão em 49%. Assim, pode-se verificar que mesmo doses inferiores aos 150 minutos por semana são benéficas, e que o aumento da dose traz igualmente benefícios adicionais para a saúde mental, ainda que não em proporção igual ao aumento da dose praticada.