Um partido não é nem nunca foi uma unidade única e indivisível — só há uma exceção: quando o partido controla o poder, quando tem muitos lugares e bem-estar a distribuir, então, sim, qualquer partido se apresenta monolítico e rochoso, o que de certa forma significa que abusa de pensar e debater. O chefe manda, o chefe pode, a tropa segue a batuta do líder, mesmo quando lhe falta direção e o rótulo certo. António Costa diz-vos alguma coisa?

Com o PS de Pedro Nuno Santos é toda uma outra história. Primeiro, porque a sua eleição partiu de certa forma o PS em dois: os que pensam que os socialistas devem procurar à esquerda os apoios e os entendimentos necessários, mesmo engolindo alguns grandes sapos, e os que julgam que esse caminho é totalmente errado e traduz uma espécie de frentismo de esquerda que acabará por fazer com o que PS, passo a passo, se afaste cada vez mais do centro, esse lugar mágico, movediço e fértil a que chamamos centro e que tantos votos pode trazer.

Na semana passada, na terça-feira, pela madrugada dentro, a reunião do PS para discutir o sentido de voto do PS neste Orçamento do Estado (OE) foi tudo menos um concentro de música celestial. Na verdade, foi uma noite de facas longas, uma daquelas madrugadas à antiga – a reunião acabou às três da manhã — em que a fratura entre os dois caminhos ficou clara, embora todos os presentes tenham reconhecido a Pedro Nuno Santos o poder de escolher o caminho.

De certa forma, Pedro Nuno sabe o que está a fazer. Quer dizer, enquanto ocupava a agenda televisiva a falar do OE, aproveitou para visitar as bases com uma intenção clara: fortalecer o apoio, ganhar adeptos, não vá o diabo tecê-las. Um dia pode ser preciso contar espingardas.

A vida de um líder da oposição é esta e é duríssima — está sempre na corda bomba. Há sempre alguém à espreita a namorar o lugar. O ex-ministro José Luís Carneiro foi o porta-estandarte nas anteriores eleições internas. De certa forma, foi a lebre de outros tenores socialistas que preferiram resguardar-se para um momento posterior e, talvez, mais promissor. Esta semana o decano é ex-ministro Vieira da Silva, que aproveitou o seu inegável estatuto senatorial para contestar Pedro Nuno e, assim, reabriu oficialmente o caminho a quem pretenda que o PS faça uma oposição diferente, designadamente no OE2025, mas não só.

A vida de PNS não será nada fácil. Será muito, muito difícil. Estará sempre debaixo de fogo cerrado — interno e externo, exatamente como aconteceu a todos (todos mesmo) os outros líderes partidários do PS e do PSD. Sobreviverá? Aguentará ao até fim? Terá capacidade e habilidade política — tática e estratégica, física e intelectual — para sofrer os embates sem jogar tudo a perder apenas para conseguir alguns poucos ganhos pontuais?

O OE2025 poderia ter sido resolvido de outra forma. Bastaria a PNS ter pré-aprovado o OE, argumentando que o fazia por tratar-se do primeiro deste Governo e para não pôr em causa a estabilidade do país e a execução (tremida) do PRR. Note-se que os empresários optaram por engolir a menor redução do IRC precisamente para não ameaçar esses dois grandes objetivos. PNS poderia ter feito o mesmo. Em vez disso, escolheu o caminho mais espinhoso. Das duas uma: ou fecha o duelo com uma espécie de vitória — exatamente qual, não se percebe bem — ou então abre ele próprio a época da caça à liderança (a liderança dele). Não faltam, obviamente, personalidades no PS com esse desejo secreto, mas hoje estão rigorosamente silenciosos.

P.S. Não lembra o diabo pedir aos militantes que deixem o PS falar a uma só voz. PNS, o jovem turco, começa a perceber o que custa exercer o poder.