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Políticas monetárias expansionistas levam a profunda transformação do setor financeiro

A decisão dos bancos centrais de subirem consecutivamente as taxas de juro para mitigar e controlar a inflação, a redução da liquidez, a revalorização dos ativos e o aumento do custo do risco marcam o início de uma nova era que a Oliver Wyman apelidou de ‘‘nova ordem monetária”.
23 Outubro 2024, 12h35

A conclusão é do relatório ‘The State of Financial Services. The New Monetary Order: European Perspective’ da Oliver Wyman, e refere que o setor financeiro europeu está a enfrentar uma profunda transformação, resultado da transição de políticas monetárias expansionistas para um ambiente de taxas de juro mais elevadas, e que marca o fim de quase quinze anos de taxas baixas.

“O setor financeiro europeu precisa de proceder a uma adaptação estratégica e operacional flexível e proativa para se manter competitivo no atual contexto de taxas de juro e volatilidade”, é uma das principais conclusões da edição de 2024 do relatório anual da Oliver Wyman,

No estudo é destacado como a transição de uma era de políticas monetárias expansionistas durante a crise financeira para um ambiente de taxas de juro mais elevadas, desde 2022, está a redefinir o panorama financeiro na Europa. Esta mudança, que põe fim a quase 15 anos de descida das taxas de juro (2008-2022, conhecida como ‘Low for Long’), promete ter implicações profundas para bancos, seguradoras, fundos de private equity e sociedades não financeiras.

A decisão dos bancos centrais de subirem consecutivamente as taxas de juro para mitigar e controlar a inflação, a redução da liquidez, a revalorização dos ativos e o aumento do custo do risco marcam o início de uma nova era que a Oliver Wyman apelidou de ‘‘nova ordem monetária”.

Os bancos, seguradoras, sociedades de capital de risco  (private equity) e sociedades não financeiras terão de adaptar-se aos desafios e às oportunidades criados pela nova ordem monetária para poderem prosperar, defende a Oliver Wyman.

A consultora de gestão diz mesmo que o setor bancário e financeiro terá de realizar investimentos na digitalização e na implementação de estratégias pan-europeias eficazes.

A Oliver Wyman explica que as taxas de juro mais elevadas aumentam o custo do crédito, o que diminui a sua procura e reduz o investimento e o consumo – o que trava a atividade económica e a inflação – ao mesmo tempo, atraem o investimento estrangeiro, o que valoriza a moeda e baixa os preços das importações.

Ora o sistema financeiro é fundamental para este processo, e a eficácia da política monetária depende da rapidez com que os bancos ajustam as condições de crédito e de depósito.

“O impacto desta política na ‘economia real’ está sujeito a atrasos e incertezas. A qualidade das decisões monetárias depende, em grande medida, da capacidade de antecipar as condições futuras e compreender a estrutura económica”, diz o estudo que realça ainda que esta capacidade torna-se particularmente crucial em situações de incertezas e choques estruturais, como pandemias ou alterações geopolíticas.

Bancos

Os bancos europeus beneficiaram inicialmente de um aumento nas suas margens de juros líquidas como resultado da subida das taxas de juro, o que melhorou temporariamente a sua rentabilidade. No entanto, neste novo contexto, os bancos enfrentam um futuro incerto, uma vez que os custos de financiamento continuam a aumentar e o valor dos ativos adquiridos durante o período de taxas baixas diminui – o que traz um rendimento inferior, explica a Oliver Wyman.

Nesse sentido, e como resultado de condições macroeconómicas desafiantes, “o setor bancário europeu vai enfrentar desafios contínuos”, defende a consultora.

As previsões de crescimento do PIB para a zona euro estão abaixo da média global, e há restrições na capacidade dos governos para fornecer estímulos adicionais devido aos elevados níveis de endividamento. Assim que as perspetivas para as taxas de juro são incertas. A inflação diminuiu recentemente, mas é pouco provável que as taxas regressem, em breve, aos níveis extremamente baixos anteriores.

A Oliver Wyman alerta que o risco do crédito vai manter-se elevado, especialmente em setores como o empresarial, o retalho e, em particular, o imobiliário comercial.

Além disso, poderá sentir-se uma vulnerabilidade adicional nas instituições financeiras não bancárias (IFNB) – especialmente nos fundos de crédito – cuja ligação aos bancos ainda não é clara.

Muitos bancos europeus operam a uma escala inferior a ideal, o que limita a sua capacidade de investir na digitalização e em novos modelos de negócio, bem como de implementar estratégias pan-europeias eficazes, conclui ainda a consultora.

Seguradoras

As seguradoras, por seu lado, vislumbram uma oportunidade de melhoria na solvência e na rentabilidade a longo prazo, embora com desafios significativos a curto prazo, especialmente relacionados com a diminuição dos fluxos de entrada líquidos e o risco de liquidez, conclui o estudo.

As seguradoras que oferecem produtos com componentes de investimento, como seguros de vida com componente de poupança, podem encontrar melhores oportunidades para gerar lucro neste novo cenário, é outra das conclusões do relatório ‘The State of Financial Services. The New Monetary Order: European Perspective’ . No entanto, tudo dependerá da capacidade de adaptar as carteiras de investimento a um contexto de taxas de juro elevadas e mantidas ao longo do tempo.

Por conseguinte, a fim de amortecer o aumento dos custos dos produtos que dependem de financiamento devido à subida das taxas juro, as seguradoras terão de ajustar – em conformidade – as suas estratégias de preços e de subscrição.

Private Equity

O setor dos fundos de private equity registou um crescimento exponencial nos anos em que as taxas de juro eram baixas. Atualmente, com a previsão de que as taxas de juro se mantenham elevadas, o private equity enfrenta um contexto para a aquisição e alienação de empresas mais difícil – perante um custo da dívida mais elevado e a possível desvalorização das empresas.

Esta situação torna as transações menos rentáveis – com uma redução de número e volume.

O setor enfrenta também desafios na valorização das empresas da sua carteira, uma vez que a mesma já não vai depender puramente da comparação com outras empresas similares no mercado.

No entanto, para o futuro há sinais positivos, pois existe capital líquido disponível para o investimento, e uma maior previsibilidade das taxas de juro, o que parece criar condições mais favoráveis para o setor, conclui a Oliver Wyman.

Empresas não financeiras

As empresas não financeiras, por outro lado, foram atingidas em duas fases. Primeiro, pela inflação e por desafios sem precedentes na cadeia de abastecimento; e, segundo, pelo aumento das taxas de juro provocado pela inflação, que reduziu as suas perspetivas de crescimento e aumentou os custos da dívida.

O estudo destaca no entanto que existem diferenças importantes entre setores. O setor imobiliário, muito endividado, foi particularmente afetado, uma vez que o aumento dos custos dos empréstimos pesou sobre a procura.

Já o setor da energia, com o aumento dos preços desencadeado pelas tensões geopolíticas, como a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, prosperou.

“As empresas continuam a ser confrontadas com um cenário desafiante, em que o custo da dívida aumentou e o crescimento económico permanece incerto. Para não fracassarem neste processo e garantirem a sua viabilidade a longo prazo, devem avaliar e otimizar as suas estruturas de capital e estratégias de investimento”, defende a Oliver Wyman.

A consultora conclui que nesta ‘Nova ordem monetária’, a “adaptação rápida e eficaz das instituições e empresas será crucial. A capacidade de inovar, de reorientar estratégias e de aproveitar novas oportunidades será a chave do sucesso neste ambiente em mudança”.

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