Mario Draghi, que à frente do Banco Central Europeu (BCE) salvou o euro, vem agora com o seu Relatório sobre a competitividade europeia tentar salvar a União Europeia (UE) da sua crise existencial, num contexto europeu que não ajuda, pois não se reclama mais Europa, antes se reacendem os nacionalismos.
Neste Relatório, Draghi defende um conceito de política industrial com o qual concordo, dizendo que a política de comércio externo, a proteção das nossas empresas contra o dumping, para assegurar o level playing field, e a gestão das cadeias de valor global que fornecem bens intermédios (privilegiando os países nossos aliados) para os produtos finais devem estar alinhadas com a política industrial, tendo esta também uma dimensão de warfare, pois um bloco que não produza tecnologias e equipamentos militares não consegue ser uma potência militar.
Este conceito de política industrial ligado à defesa, bem evidente no Chips Act americano, tem sido muito defendido pelo conselheiro de política de segurança e defesa da Administração Biden, Jack Sullivan, que tem sido um dos principais teóricos da política industrial americana, a qual tem dois grandes instrumentos: o Inflation Reduction Act e o Chips Act.
Sullivan também defende que a política de captação do Investimento Direto Estrangeiro, bem como os investimentos no exterior devem estar articulados com as políticas industrial e de segurança, coisa que os americanos já estão a fazer.
Draghi não esquece que a política industrial tem de assentar sobre o aprofundamento do mercado único europeu. Aqui, Draghi veio dizer que a política industrial não devia servir para subsidiar campeões nacionais, antes deve apoiar setores estratégicos para a segurança e defesa, na linha do que referi para os EUA, e apoiar políticas horizontais.
Mas não sendo a UE um Estado Federal como os EUA, nem um Estado com o controlo centralizado do Partido Comunista, como a China, torna-se muito mais difícil executar na União uma política industrial centralizada em Bruxelas, sendo necessária uma grande coordenação entre o nível comunitário e os níveis nacionais, o que não será nada fácil! Faltam, pois, na UE, níveis centrais de decisão, e estaremos aqui claramente em desvantagem face aos EUA e à China.
Tenho a maior dúvida que a atual Comissão Europeia e os seus eurocratas tenham a capacidade de implementar este exigente conceito de política industrial, que nos permita ombrear com os EUA e a China.