Trump ganhou de forma muito mais nítida do que o esperado, a que se soma a maioria republicana no Senado e, como elevada probabilidade, na Câmara dos Representantes. Neste momento, é muito mais útil uma análise racional e aprofundada sobre estes resultados eleitorais do que julgamentos morais e rasgar de vestes.
Aliás, tenho a forte suspeita de que, ironicamente, quem tem esse tipo de comportamento é quem mais alimenta este tipo de desfecho eleitoral, nos diferentes países. A bolha político-mediática precisa de tomar consciência em que medida tem um discurso esotérico para a generalidade das pessoas e as está a empurrar para políticos populistas.
Saltando das questões políticas para as económicas, foquemo-nos nos riscos proteccionistas do novo líder dos EUA. Uma das promessas eleitorais era a de lançar tarifas de 20% para a generalidade dos parceiros, aliados ou não, e de 60% sobre a China.
Antes de mais, é de esperar que haja pressão por parte dos bilionários que financiaram a sua campanha, para que haja, no mínimo, uma suavização destas ameaças. Para que as taxas das tarifas não sejam tão elevadas e para que haja uma diferenciação entre aliados e os restantes países. No seu primeiro mandato, também houve sucessivas ameaças de tarifas, que faziam cair as bolsas norte-americanas, que recuperavam sempre que essas ideias eram afastadas.
A Europa está um pouco preocupada, mas não parece inteiramente consciente dos riscos indirectos. A China envia 16% das suas exportações para os EUA e 18% para a Europa, pelo que será muito tentada a compensar a perda do mercado norte-americano com o europeu. Podemos considerar três efeitos, dois dos quais económicos, quase automáticos, que aconteceriam em qualquer país.
Se existir uma forte redução das exportações chinesas para os EUA, isso levará a um efeito quase mecânico no mercado cambial, de depreciação da moeda chinesa. Em segundo lugar, as empresas afectadas pela redução das vendas sabem que têm sempre que suportar os chamados custos fixos, que têm sempre que ser suportados, quer haja vendas quer não. Por isso, serão quase obrigadas a baixar os preços, para conseguir vender o que produzem. Sublinho que estes dois efeitos são quase inevitáveis.
Para além destes efeitos, haverá certamente um terceiro, de resposta política das autoridades chinesas, que quererão evitar que milhões de trabalhadores vão para o desemprego, e que poderão dar subsídios às empresas mais afectadas. Em resumo, é muito provável que a Europa seja invadida por produtos chineses ainda mais competitivos do que actualmente. Também será de esperar que haja resposta europeia a esta ameaça, mas isso só aumentará o risco de generalização de uma guerra comercial mundial.
Na relação da UE com os EUA, haverá o problema adicional das tarifas “ambientais” europeias, para compensar a diferença de regulamentação, o que deverá ser usado pelos norte-americanos para retaliar com voz grossa.
P.S. É evidente que será necessário fazer todos os possíveis para ter uma relação cordata com a administração Trump. Isso poderá não produzir todos os resultados de que gostaríamos, mas uma atitude de conflito é que não os produzirá, de certeza. Esta talvez seja também a melhor atitude a ter em relação aos políticos extremistas nacionais.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.