A transformação digital é uma prioridade estratégica para a União Europeia e, como resposta ao aumento exponencial de dispositivos conectados no mercado europeu e ao crescimento da Internet das Coisas (IoT), o Data Act é uma peça central nesse processo. No entanto, no meio da avalanche regulatória da Estratégia Digital Europeia que é, por exemplo, o AI Act e outros diplomas, muitas empresas subestimam a urgência deste regulamento cuja aplicação, salvo algumas exceções, começa em setembro de 2025.
O objetivo principal do Data Act é garantir que os utilizadores de produtos conectados — como os automóveis, máquinas industriais ou dispositivos médicos —, ou de serviços conexos, tenham maior controlo sobre os dados que geram. Note-se também que o regulamento se aplica tanto a empresas quanto a particulares e pretende assegurar um equilíbrio entre a proteção dos direitos dos utilizadores e a manutenção de incentivos para aqueles que investem em tecnologias baseadas em dados.
Entre as principais obrigações e novos conceitos introduzidos pelo Data Act destaca-se a regulação da comunicação de dados entre empresas, e entre empresas e consumidores. O regulamento concede aos utilizadores o direito de acederem aos dados gerados pelos produtos conectados ou serviços conexos que utilizam. Salvo algumas exceções, deverão poder fazê-lo diretamente ou solicitar ao detentor dos dados (por regra, a empresa que fabrica o produto conectado ou que presta o serviço conexo, e que deverá possuir um contrato com o utilizador, como um contrato de venda, arrendamento ou de prestação de serviços) que os forneçam a um terceiro da sua escolha.
Para além da IoT, o Data Act vai ter também implicações significativas no sector de computação em nuvem. O regulamento introduz regras para facilitar a migração de dados entre fornecedores de serviços cloud exigindo a criação de interfaces abertas e a utilização de formatos de dados legíveis por máquinas. A partir de 2027, os custos de migração de dados deverão ser eliminados, mas até lá, os fornecedores podem cobrar por esses serviços de forma transitória.
Outro ponto a destacar é a proteção das pequenas e médias empresas (PME), frequentemente vulneráveis a cláusulas contratuais abusivas. O Data Act estabelece uma lista não exaustiva de cláusulas que não podem ser impostas unilateralmente em contratos relacionados com dados, protegendo as empresas mais pequenas de práticas negociais injustas por parte de grandes operadores do mercado.
Consequentemente, o impacto do Data Act será vasto e abrangerá várias indústrias. Em termos práticos, os fabricantes de produtos conectados, como frigoríficos, automóveis, motores a jato ou maquinaria avançada, e prestadores de serviços conexos, terão de adaptar a oferta para cumprir com as obrigações de acesso a dados.
Por um lado, modelos de negócio baseados na venda de serviços que utilizam dados dos clientes estarão sob maior escrutínio. Por outro, as empresas que prestam serviços de computação em nuvem, especialmente no âmbito de Software as a Service (SaaS), terão de rever e ajustar os seus contratos e operações para cumprir com as obrigações de interoperabilidade e migração de dados.
O Data Act foi formalmente adotado em dezembro de 2023 e será aplicável a partir de setembro de 2025. No entanto, o regulamento prevê a publicação de vários atos de execução e orientações, o que significa que o quadro legislativo ainda está em evolução. Ainda assim, a Comissão Europeia publicou recentemente uma FAQ sobre o diploma, destacando a importância de as empresas se prepararem desde já para cumprir com as suas obrigações e evitar riscos de não conformidade. Este processo inclui a revisão das práticas de gestão de dados, a adaptação de produtos conectados e serviços de dados, e a eliminação ou renegociação de cláusulas contratuais abusivas.
Estar à frente no cumprimento do Data Act poderá não só ser uma questão de conformidade legal, mas também uma vantagem competitiva significativa no mercado digital da União Europeia.
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