O efeito Ana Gomes já se fez sentir: o “The Guardian” saiu do X. Brincadeiras à parte, o tema dá que pensar. Para a generalidade da imprensa outrora dominante, ou imprensa de legado (legacy media), Musk é um Tio Patinhas delirante com tendências fascistas. A parte do delirante, nem contesto. A do fascista é que me causa espécie. Então, não era ele o grande herói do empreendedorismo verde? O cofundador da SolarCity (2006) – produtora de painéis solares para casas de zero emissões – e da Tesla, o primeiro carro elétrico de jeito?

Afinal, nada disso interessa. Pelo menos, desde que comprou o Twitter, agora X. Os guardiões da ideologia estão menos preocupados em promovê-la do que em silenciar quem a conteste. A livre expressão tornou-se o pecado capital do século XXI. E Musk o pecador dos pecadores, um apóstata. Por isso, quiseram expurgá-lo, declará-lo anátema. Resultado: a emenda foi pior que o soneto. Não satisfeito com o mero pecado, o ex-herói verde passou ao sacrilégio – uniu-se a Trump.

O problema de fundo está na falta de empatia intelectual, cultural e política. Musk não nasceu em Portugal. Mas, num país anglo-saxónico, onde, entre certas elites, a cultura de negócios não desapareceu. Mais ainda, emigrou para os Estados Unidos, onde o conservadorismo e o libertarianismo de direita estão enraizados, enquanto reação. Para nós, ler Mises, Hayek ou Rothbard é um disparate. Para eles, não. Antes é tentar compreender como a experiência americana se foi degradando à imagem do socialismo europeu.

Ao contrário do que se pensa, Musk não é um Tio Patinhas. No seu momento mais frágil, politicamente, ele deu provas da sua convicção, mandando bugiar os patrocinadores do Twitter, que ameaçavam sair da plataforma. Ele é mais uma prova de que os seres humanos, e sobretudo os que tendem a ser bilionários, não se movem por dinheiro. Mas por um sentido, como diria Victor Frankl. Buscamos um projeto, melhor ainda, uma narrativa com sentido.

Será, porém, delirante? Sim, evidentemente. Mas vejamos o seu delírio: tomou conta da Tesla quando a companhia perdia quatro milhões de dólares por dia, tornou a SpaceX mais eficaz que a NASA, criou a OpenAI, que todos nós usamos (ChatGPT), a Neurolink, que promete revolucionar o mundo da medicina, a Boring Company que reduziu como nunca o preço das perfurações subterrâneas, e isto parece ser apenas o começo.

Tudo isto por um sentido. Qual? Não certamente o monopólio. Musk não é um Rockefeller. Se fosse, para quê abrir o mundo à concorrência? Para quê lutar pela desregulamentação e o mercado livre? Trata-se do oposto do que o Sr. Rockefeller fez no início do século XX. Musk é o DOGE. Não somente o responsável pelo Departamento de Eficiência Orçamental, mas o rosto de uma nova forma de pensar a economia e a política. Justamente, o fim dos tios patinhas.