Será preferível ter uma fatia pequena de um bolo grande ou uma fatia grande de um bolo pequeno? Esta pergunta pode parecer despropositada, mas é, na verdade, o mote para uma discussão habitual no seio do ecossistema de inovação nacional.

Deixando momentaneamente as sobremesas de lado, é ponto assente que, quer falemos de startups ou de qualquer outro produto financeiro, existe um paradigma comum a todos os investimentos: não há mais retorno sem mais risco. É por isso que, quando olhamos para o panorama das startups nacionais, vemos muitos negócios a adotarem um modelo de crescimento rápido, normalmente associado a financiamento por capital de risco. Do outro lado, estão as startups que adotam um modelo de crescimento sustentável, típico de negócios autofinanciados (bootstrapped) e que se focam na rentabilidade desde o início, com uma gestão mais cautelosa dos recursos.

O financiamento por Venture Capital (VC) trata-se, sem dúvida, de um jogo de alto risco e alta recompensa. A possibilidade de uma grande injeção de capital e o prestígio associado tornam esta opção muito atrativa para os fundadores, especialmente aqueles que querem ganhar tração rápida em mercados grandes e competitivos ou precisam de desenvolver propriedade intelectual de forma acelerada.

No entanto, na minha perspetiva, só uma fração de startups realmente beneficia de uma injeção massiva de capital nas fases iniciais. Para a maior parte delas, este financiamento pode criar uma pressão excessiva para atingir metas de crescimento a qualquer custo, o que pode levar a decisões precipitadas. Dados recentes indicam, aliás, que o número de startups apoiadas por VC que enfrentam a falência está a aumentar, o que reflete os riscos significativos associados a esta abordagem, ainda por cima na atual conjuntura macroeconómica.

A médio prazo, startups que dependem de um modelo de crescimento acelerado enfrentam também o desafio de justificar as suas valorizações elevadas e de manter o ritmo exigido pelos investidores. A eventual necessidade de angariar sucessivas rondas de investimento pode acabar ainda por “diluir” ainda mais os fundadores, perdendo estes o controlo sobre a estratégia – algo que dificilmente acontece num modelo de autofinanciamento.

Por outro lado, startups que adotam uma estratégia de crescimento sustentável tornam-se mais resilientes à volatilidade dos mercados financeiros. Não deixam, no entanto, de estar sujeitas a riscos, nomeadamente o de terem outros players a ganhar uma posição dominante no mercado ou de existir um salto evolutivo tecnológico significativo que inviabilize o modelo de negócio. Não ter condições financeiras para competir pelos melhores profissionais é outro dos riscos.

Em Portugal, existe uma obsessão por unicórnios. Este foco em criar startups com valorizações multimilionárias, performances assinaláveis e recordes atrás de recordes leva a uma cultura que, por vezes, valoriza mais a especulação e as headlines do que propriamente o valor criado. E é claro que esta ambição é positiva, mas é importante que não deixemos que ela nos tolde uma perspetiva realista dos negócios.

Este interesse desmedido por headlines ofusca a necessidade de maior escrutínio e acaba por ser, de certa forma, um retrato de um ecossistema pouco maduro. O verdadeiro sucesso de uma startup não pode ser medido apenas pela sua valorização, mas sim pela capacidade de criar impacto real, empregos estáveis e sustentar o seu crescimento a longo prazo. Falências recentes de grandes startups internacionais, como Theranos, WeWork ou Nikola, são lembretes de que a falta de uma avaliação crítica desde o início pode ter consequências graves.

A verdade é que o crescimento rápido não tem de ser crescimento alavancado ou até especulativo. Nada impede que uma empresa cresça rapidamente sem comprometer a sua existência futura. O segredo é simples: angariar clientes e servi-los de forma eficiente e eficaz. Receber capital de risco também não torna, automaticamente, um negócio pouco sustentável. A sustentabilidade está, na realidade, intrinsecamente ligada às decisões de curto prazo e ao seu impacto a longo prazo. Até porque, muitas das vezes, o caminho de uma startup contempla estas várias fases: crescimento rápido e lento, períodos de investimento e de consolidação.

A Tableau Software é um bom exemplo disto. Inicialmente, seguiu o modelo bootstrapped, concentrando-se na rentabilidade e na criação de um produto que alcançou o product-market fit. Foi apenas depois de ter uma base sólida e processos eficientes que decidiu captar investimento, o que lhe permitiu crescer rapidamente e expandir para novas geografias. Este caso demonstra como é possível e, muitas vezes, vantajoso combinar crescimento rápido e sustentável.

A capacidade de identificar e atender às necessidades do mercado, construindo produtos e serviços que gerem valor real, é, em última análise, o diferencial que impulsiona o crescimento sustentável. Exemplos como a Stripe e a Mailchimp, empresas que todos nós conhecemos, demonstram que é possível construir empresas multimilionárias sem depender excessivamente de investimentos externos.

Mais do que unicórnios, o ecossistema de empreendedorismo português precisa de verdadeiros casos de sucesso, de exits, de fundadores e equipas iniciais que contribuam de volta para o ecossistema, iniciando novas startups e abrindo novos fundos de investimento.

No final do dia, o verdadeiro sucesso de uma startup avalia-se por métricas simples: o foco no cliente e a criação de valor real. Se estas questões se mantiverem no centro da nossa estratégia, acabaremos por ter, muito provavelmente, uma fatia significativa, independentemente do tamanho do bolo.