O meu balanço anual cingir-se-á nos aspectos políticos relevantes nos PALOP, sobretudo quando estes países estão em véspera de festejar os cinquenta anos de independência em 2025.
Em Angola, o ano político terminou com a realização do VIII Congresso Extraordinário do MPLA que trouxe uma mudança na vice-presidência do partido e afastamento de algumas figuras do Bureau Político. Este evento é uma antecâmara do processo eleitoral angolano a decorrer em 2027, porque o Presidente João Lourenço está impedido à luz da Constituição angolana de 2010 de concorrer para um terceiro mandato. Para tal, foi essencial rever o artigo 120.º do estatuto do MPLA que determinava que o presidente do partido seria, forçosamente, o cabeça de lista nas eleições de 2027. Em caso de vitória do MPLA, haverá o retorno da situação de bicefalia que marcou a fase inicial do primeiro mandato de João Lourenço.
Aprovou-se a Divisão Política Administrativa de Angola que criou mais três províncias, passando a ter 21 províncias, cujo efeito imediato é aumento de mais 15 deputados nas eleições de 2027. Este cenário reflecte o fenómeno de engenharia eleitoral através da técnica de gerrymandering que representará indubitavelmente uma diminuição do peso eleitoral dos grandes círculos eleitorais em 2027, como Luanda, Huíla, Benguela e Huambo que representam mais de 60% da população eleitoral. Em contrapartida, haverá um aumento da representatividade das pequenas províncias, onde o MPLA tem conseguido obter um bom resultado eleitoral.
A oposição angolana enfrenta uma situação complexa devido às difíceis condições de realizar o seu papel de fiscalização da actividade governativa e afirmar-se como alternativa ao MPLA, porque a liberdade de imprensa é limitada e o acesso aos órgãos públicos não existe para as actividades partidárias da oposição. Acresce a obrigação legal de o Bloco Democrático concorrer nas eleições de 2027, caso contrário, será extinto pelo Tribunal Constitucional. Por outro lado, o PRA-JA foi, formalmente, constituído pelo Tribunal Constitucional e precisa ter uma noção do seu peso político-eleitoral. Contudo, as declarações dúbias do presidente do PRA-JÁ Abel Chivukuvuku quanto à sua posição depois das eleições, que já avançou a possibilidade de viabilizar um governo do MPLA, têm gerado desconfiança no seio da Frente Patriótica Unida (FPU). Coloca-se, pois, a questão se a FPU será mantida nos termos actuais ou passará a ser uma coligação-eleitoral formal nas eleições de 2027.
A visita oficial de um Presidente dos EUA, pela primeira vez, representou uma vitória da política-externa do Presidente João Lourenço que tem procurado, desde o primeiro mandato, uma aproximação com os poderes em Washington. Essas relações se encontram agora no estado de incerteza devido à vitória de Donald Trump.
Em Moçambique, as eleições de 2024 têm sido decisivas para o futuro político do país. Venâncio Mondlane, candidato do Podemos, rejeitou os resultados provisórios que declararam a vitória de Daniel Chapo, da FRELIMO, questionando assim, a legitimidade do processo eleitoral. Em resposta, convocou manifestações populares com forte adesão dos moçambicanos, enfrentando uma repressão desproporcional por parte das autoridades, que já resultou em pelo menos 130 mortes, segundo a Plataforma Eleitoral Decide.
O Conselho Constitucional moçambicano reconheceu os resultados eleitorais, declarando a vitória do candidato da FRELIMO, Daniel Chapo. Este acto constitui um duro golpe nas expectativas dos moçambicanos, provocando, por efeito, uma intensificação da contestação e da revolta popular, além de gerar um governo impopular e até ilegítimo. Espera-se, assim, que 2025 comece com protestos que poderão se prolongar até à tomada de posse do novo presidente.
A Guiné-Bissau continuou a vivenciar a crise político-institucional em 2024, após a dissolução da Assembleia Nacional em 2023, pelo Presidente Umaro Sissoco Embaló, e a criação de um governo de iniciativa presidencial. O adiamento sine die das eleições legislativas sem procurar restabelecer a legitimidade democrática ao Governo, acabou por agravar a instabilidade e enfraquecer as estruturas do Estado. Representando um grave prejuízo na imagem externa do país. Aguardam-se as novas eleições e maior contenção política do Presidente Embaló para restaurar a estabilidade, em 2025.
Em Cabo Verde, o PAICV (na oposição) venceu as eleições autárquicas, com 15 câmaras municipais, e o MpD (governo) alcançou 7. Os resultados confirmam o bipartidarismo, incapaz de promover o desenvolvimento e fortalecer a democracia. A falta de emprego levou 64% da população a desejar emigrar, enquanto a confiança nas instituições é baixa: com 40% (Presidente da República), 31% (Primeiro-ministro) e 29% (Assembleia Nacional), segundo a Afrosondagem.
Em São Tomé e Príncipe, destacou-se a possibilidade de uma consulta popular para alterar o sistema político, visando formalizar o presidencialismo e superar as ambiguidades de gestão governativa, resultantes do semipresidencialismo.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.