A questão não é retórica. Um estudo que a Associação Nacional de Proprietários está a fazer sobre quem anda em Lisboa à procura de casa para arrendar, conclui que cerca de 90% não pode pagar uma renda superior a 150 euros por mês! A percentagem poderá melhorar alargando a procura de casas a 200 euros por mês…

Isto significa que muito dificilmente algum português conseguirá morar em Lisboa tendo em conta a quantidade de pessoas que anda a fingir que é prestador de serviços, passa recibos verdes e apresenta rendimentos médios mensais entre os 500 e 600 euros. Ora, se aplicar uma regra simples para evitar o excesso de despesas fixas, a renda de casa ou a prestação ao banco não deve pesar mais do que um terço do rendimento bruto, rapidamente se conclui que não há condições para 90% de quem procura casa conseguir sequer um quarto.

E tudo acontece com as forças políticas a assobiarem para o lado, oferecendo soluções caricatas como seja o modelo de permanência vitalícia com pagamento à cabeça de um bónus ao proprietário, algo que deixou inquilinos e senhorios absolutamente descrentes. Ou ainda se assobia para o lado quando se promete que hospitais, quartéis, palácios e outros edifícios públicos serão convertidos em residências para estudantes ao longo dos próximos anos. Só acredita quem quer em ano eleitoral, a que se seguirão anos de violento controlo orçamental.

Mas o tema da habitação atinge ainda patamares ainda mais caricatos numa altura em que se debate a Lei de Bases da Habitação. Caso de uma audiência com as associações de proprietários, que não foi gravada devido a uma falha técnica. Ora, todas as audições parlamentares são gravadas e filmadas para ficarem à disposição do público, mas com aquelas isso não aconteceu, sublinhou o presidente da ANP, Frias Marques. Ficaremos sem saber o “espírito” das conversas.

Aquilo que vamos sabendo é que as regras para a habitação já entraram em vigor, excetuando aquelas que vêm no seguimento da suspensão provisória dos despejos até 31 de março. Sabemos que será uma lei enquadradora com princípios discutíveis e redundante – citamos, a título de exemplo, a proibição de despejos no inverno quando, dificilmente, haverá despejos no futuro. Tal como se criou um modelo que muito dificilmente permitirá a um cidadão de 50 anos e com rendimento médio obter um contrato de arrendamento, tendo em conta as obrigações do senhorio perante arrendatários acima dos 65 anos ou com perda abrupta de rendimentos. E para quem pagar a renda atrasado até há um bónus, pois a indemnização de 50% passou para 20%.

Os senhorios – com quem se deveria contar – são efetivamente um alvo, ficaram com o odioso e, claro, perderam a força que enfermeiros e professores conseguem ter. O futuro será a extinção?