A economia paralela continua a ser o verdadeiro ‘elefante na sala’ em Portugal, em particular no sector da habitação, onde reflete e agrava a crise no sector, que se faz sentir de forma acentuada no litoral.

Um estudo da Faculdade de Economia do Porto (FEP) estimou em quase 35% o peso da economia não registada, também designada como paralela, em 2022 – o estudo, do qual sou coautor, foi publicado no final de 2024 numa revista científica internacional indexada, após revisão por pares. Trata-se de uma estimativa global para a economia, com base num modelo macroeconómico.

É, por isso, natural que haja áreas com maior incidência da economia paralela. Tal parece ser o caso do mercado de arrendamento. Segundo a própria Inspeção-Geral das Finanças, cerca de 60% dos contratos de arrendamento em Portugal são informais. Este número é alarmante, não só porque representa uma enorme perda de receita fiscal, mas também porque fragiliza os próprios inquilinos, privados de garantias legais e sujeitos à arbitrariedade de senhorios com menos escrúpulos.

Como referi num artigo recente neste mesmo espaço de opinião, a recuperação do valor da economia paralela em níveis realistas, através de medidas adequadas, pode ajudar a financiar despesas públicas essenciais, como nas áreas da saúde e educação. Será também importante apostar em medidas específicas para reduzir a informalidade no mercado de arrendamento, angariando receitas que podem ser canalizadas para políticas de habitação acessível, com recurso ao setor público, privado e cooperativo.

A crise habitacional não se resolve apenas com incentivos à construção ou programas de arrendamento acessível. Enquanto o Estado não conseguir garantir que o mercado opera dentro das regras, estará sempre a ‘tapar o sol com a peneira’. A informalidade distorce preços, cria insegurança jurídica e perpetua a exclusão social. É preciso reforçar a fiscalização, mas também criar incentivos reais à formalização dos contratos com políticas adequadas, protegendo em simultâneo as famílias de baixos rendimentos.

Um mercado de arrendamento funcional é essencial para a dignidade dos cidadãos e o acesso mais distribuído e equitativo às oportunidades de emprego pelo país, contribuindo para reduzir a taxa de desemprego de uma forma estrutural.

Portugal tem, assim, uma oportunidade única de combater vários problemas em simultâneo: a economia informal, a crise da habitação e o desemprego. Para isso, é preciso coragem política, articulação institucional e uma visão estratégica com medidas de incentivo integradas de forma coerente.

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