1. O envelhecimento da população portuguesa é um problema sério e é fundamental encontrar soluções estruturais eficazes, transformando o problema numa oportunidade.

O crescente envelhecimento da população, a par do aumento da esperança de vida, é uma realidade à escala mundial, resultante de vários fatores : a adoção de um estilo de vida mais saudável (alimentação, exercício físico…), o acesso a cuidados de saúde mais sofisticados e eficazes, uma vida social e de entretenimento mais intensa e, sempre que possível, a oportunidade duma atividade profissional estimulante.

Sabemos que uma estrutura social saudável passa por uma distribuição etária equilibrada da população, com uma boa taxa de natalidade e mais população na chamada idade ativa para que a fração de seniores possa estar limitada. Mas não é isso que se passa em Portugal.

Primeiro, há uma clara queda da natalidade autóctone – não obstante o bom registo de 1,45 nascimentos por mulher vs 1,46 de média europeia, está provado que isso não se deve aos casais autóctones mas sim à mais prolífica população emigrante. Segundo, a emigração crescente de jovens qualificados, já superior a 100.000 por ano e que quando voltam já o fazem na meia idade – vêm muito bem preparados, mas a sua ausência espoleta um aumento relativo de seniores e o seu regresso vai aumentar a prazo a taxa de seniores na população.

Por outras palavras, podíamos dizer que não há excesso de seniores mas sim falta de bebés e de jovens qualificados a viver enraizados em Portugal.

Sendo difícil agir sobre os dois primeiros aspetos, é sobre os seniores que há muito mais a fazer e ganhar, e é urgente porque a situação está a ficar perigosa como indicam as assustadoras estatísticas .

Segundo a Fundação Francisco Manuel dos Santos, Portugal tem a quarta maior taxa de população com mais de 65 anos a nível mundial, só superada por Japão, Itália e Grécia. E no Eurostat vemos que a taxa de seniores por população ativa subiu de 23% em 1990 para 37% em 2022, e que a taxa de população sénior aumentou de forma dramática nos últimos 50 anos – de 9,7% da nossa população residente em 1970 para 23,4% em 2021.

A longo prazo, prevê-se um agravamento da situação: o INE aponta para um peso da população sénior de 36.8% em 2080 e o Fundo Monetário Internacional e a União Europeia (UE) estimam que os encargos com pensões em Portugal atinjam 17% do PIB em 2070. Mas, hoje, o impacto económico já é dramático: em 2019, os encargos com pensões já pesavam 14% no PIB, um dos valores mais altos da UE.

Com a dimensão económica que esta situação já assume, e as perspetivas para o seu agravamento, dada a diminuição da população ativa, a baixa produtividade nacional e a brutal carga fiscal, já não é possível enfiar a cabeça na areia e ignorar a situação e os incomportáveis custos económicos e sociais associados.

Neste contexto, a única via de ação pragmática é o regresso dos seniores à vida profissional ativa – ou manter uma atividade profissional na empresa quando se reformam em vez de fazer uma festa e mandá-los para casa no dia seguinte. Isto exige uma profunda mudança de mentalidades face ao estigma que se criou ao longo de gerações, bem ilustrado no famoso anúncio do Restaurador Olex.

2. Há que entender que os seniores de hoje evoluíram muito desde a geração anterior – a expressão “65 são os novos 45” não surge por acaso, tem suporte científico.

O envelhecimento traz limitações físicas naturais, mas, hoje, os seus efeitos são cada vez menores e mais tardios e, ao mesmo tempo, os seniores preservam e desenvolvem muito mais atributos positivos do que no passado. Com efeito, a sua mentalidade é muito mais positiva com a passagem dos anos graças ao desporto, a hobbies produtivos ou a atividades lúdicas frequentes com a família e amigos e, sobretudo, à realização pessoal derivada duma atividade profissional compensadora.

Estudos demonstram que este espírito positivo reduz a probabilidade de declínio cognitivo, do sentimento de solidão, de depressão e mesmo de doenças crónicas. São estes os novos seniores – pessoas física e mentalmente muito ativas , com 65 anos ou mais, que se comportam e sentem como se tivessem 45.

Esta constatação é ainda mais vincada quando se observa que a saúde e o cuidado com o bem-estar físico e psicológico dos seniores hoje em dia, conduzem a um estado de felicidade superior ao que a pessoa viveu como jovem adulto. Esta foi aliás a conclusão da peça que o The Economist publicou em 2010, “The U-bend of life: Why, beyond middle age, people get happier as they get older”. Foi a primeira vez que uma reputada publicação de larga circulação veio provar que a felicidade segue uma curva em U: muito alta na adolescência, mínima na meia-idade e a partir daí uma subida que leva ao máximo absoluto depois dos 80 anos.

Esta notícia fantástica caiu que nem uma bomba de flores na comunidade das pessoas de meia-idade, cuja relativa infelicidade (estão na base do tal U) as levava a temer ficarem mais velhas, que caminhavam irreversivelmente de mal a pior. “Este estudo mudou a minha vida, hoje encaro o meu envelhecimento com vontade e expectativa e não com medo”, dizia-me a propósito uma pessoa de família. E se os seniores de hoje são mais felizes do que os seus pais ou avós, então vão conduzir a vida da melhor maneira e viver mais tempo, é um ciclo virtuoso.

3. A população sénior possui atributos distintivos intrínsecos que compensam largamente os efeitos do seu envelhecimento – seja qual for o seu nível de qualificação, seniores com experiência profissional e vontade podem ser ativos de grande valor para qualquer empresa.

Numa perspetiva profissional, estes novos seniores trazem um conjunto de atributos distintivos que os colocam num patamar acima dos jovens ou das pessoas de meia-idade e, por isso, representam benefícios únicos para fortalecer as competências e capacidades duma organização empresarial.

  • Maior sabedoria e resiliência derivadas de uma experiência de vida mais longa, de ambições limitadas e do desejo de provar sempre o seu valor
  • Mais apetência para os desafios da atividade profissional pela experiência, segurança e calma para os enfrentar com sucesso
  • Maior inteligência emocional permitindo ajudar a criar um melhor ambiente profissional, trabalho em equipa e relações estreitas entre colegas
  • Melhores relações com a família, os amigos e os colegas, gerando um halo de bem-estar que contagia naturalmente a organização
  • Tranquilidade e positividade derivada de maior paz interior.

4 . Não obstante os atributos profissionais distintivos dos seniores, ou o impacto económico e social da sua reintegração, as empresas portuguesas ainda vivem estigmatizadas com a admissão ou retenção de seniores – só pela idade que está no BI, mais nada.

Há uma noção prevalecente na sociedade e no meio profissional de que um reformado é alguém que já deu o que tinha a dar e agora deve descansar e gozar como puder o resto da vida. Voltar a trabalhar está fora de causa: está velho, está desatualizado, já não tem cabeça nem energia, vai ser um peso morto na organização, nem pensar nisso. Na cabeça destes gestores, os seniores são os jogadores de dominó na Alameda ou os clientes dum café no Alentejo num dia de semana à tarde a beber minis.

É nesta mentalidade predominante que reside a causa de termos desempregada uma população sénior saudável, preparada e com vontade de voltar a trabalhar. Só vamos reduzir o custo social dos seniores se mudarmos essa mentalidade. Como refere, num tom resignado, a Profª Paula Albuquerque, do ISEG: “Há claramente uma possibilidade de valorizar as competências das pessoas mais velhas. Esse trabalho está (…) por fazer. Ainda há muito preconceito etário.”

5. Paradoxalmente, em Portugal, como em toda a Europa, as empresas sentem dificuldades em encontrar candidatos para preenchimento dum crescente número de vagas – e vários países estão a apostar seriamente na atração de seniores de volta ao mercado de trabalho.

Vários países estão a mudar a sua mentalidade e a apostar na atração de seniores à vida profissional ativa. Os EUA estão claramente na dianteira, com os seniores a representar já o segmento de crescimento mais rápido da força de trabalho americana desde 2017. Em 2021, o Bureau of Labor Statistics projetou que o número de indivíduos ativos com 75 anos ou mais cresceria 96,5% até 2030. O Reino Unido e a Alemanha estão a seguir as pisadas dos EUA. Exemplos que comprovam a oportunidade que estamos a perder em Portugal devido a falta de atenção, a uma visão estreita das oportunidades do mercado de trabalho e a preconceitos sem razão de ser.

6. A aptidão dos “novos seniores” é bem ilustrada por exemplos de personalidades famosas e quadros de direção de empresas.

Joe Biden tem 81 anos e ganhou as Presidenciais aos 78. No desporto temos Cristiano Ronaldo com 39, Pepe com 41, Fernando Alonso com 42 e o quarterback Tom Brady ainda joga aos 45. O grande Morgan Freeman só ficou famoso aos 50 anos, quando fez o papel de motorista em “Driving Miss Daisy” e conquistou o seu Óscar aos 68 anos. Estes e muitos outros são fontes de inspiração para que os seniores entendam que podem chegar longe com o estado de espírito e o estilo de vida certos.

Em Portugal, temos nas empresas a aversão generalizada e o preconceito aos seniores de que já falámos – mas também aqui há exceções. Existem no nosso País grandes empresas, normalmente familiares, onde a experiência e o contributo de vida à empresa da primeira linha de gestão, muitos com mais de 70 e mesmo 80 anos, é tão valorizada que os acionistas se recusam a pôr termo às suas carreiras. Num caso, a minha empresa ARBORIS recomendou a sua manutenção na empresa num Conselho de Senadores, permitindo assim que os seus lugares de Direção fossem ocupados por quadros de 35 a 45 anos com o perfil certo e bem preparados.

Esta atitude reflete uma mentalidade aberta e inteligente que devia contagiar todo o setor empresarial privado. E traduz uma prova irrefutável do valor que uma boa empresa, sólida e em crescimento, sabe dar aos seus quadros com mais de 65 anos e o valor distintivo que estes ainda podem aportar.

A manutenção em funções, ou o regresso de seniores reformados à atividade profissional, aporta benefícios relevantes para a economia nacional a vários níveis

Oferecendo aos seniores a oportunidade de voltar à vida profissional ativa, estamos a garantir uma geração de rendimentos adicionais aumentando as contribuições da população ao Estado, as quais podem ser decisivas para retirar pressão sobre o aumento do valor das pensões. Por outro lado, estes seniores vão enriquecer a base de conhecimento e experiência das empresas e, consequentemente, a própria produtividade da economia – porque a mesma população vai produzir mais bens e serviços. E, finalmente, ainda temos os efeitos na economia do aumento de receitas fiscais, de redução de encargos com a Segurança Social e de redução de encargos de saúde com idosos, que poderiam ser expressivos e inverter as projeções negativas.

A reintegração profissional de seniores só terá expressão se houver uma adesão maciça das empresas – o que implica uma ação a vários níveis do Governo a Associações Empresariais, Fundações empresariais e entidades privadas especializadas neste desafio.

A reintegração de seniores no mercado de trabalho é uma oportunidade enorme, com todas as condições para contribuir de forma relevante no combate aos custos associados ao envelhecimento da população e que, em paralelo, traga benefícios relevantes às empresas.

As empresas devem assumir formalmente objetivos para contratação de seniores, assim como devem existir incentivos nesse sentido por parte do Estado e de outras entidades. E as associações empresariais, o Governo e a sociedade como um todo têm a responsabilidade de abraçar o desafio e contribuir para que se tire o maior proveito de uma população envelhecida, mas profissionalmente ativa, começando pela consciência de que um sénior pode ser um profissional valioso e não um velho inútil e acabado a quem dizemos, fechando lentamente a vitrine… “Desculpe mas já estamos servidos”.