A AD ganhou, tem mais mandatos. Mas talvez mais importante seja notar que tem um Governo de minoria dotado de um suplemento de força extra: esse suplemento chama-se desmando do PS. Pedro Nuno Santos deixa os socialistas com uma derrota que lembra a de Almeida Santos, o homem que, mesmo à época, suscitava nas pessoas o apelo de um contabilista. Acontece que Pedro Nuno está a pagar as contas de António Costa: não só Costa não reformou o país — ele destratava assumidamente essa ideia —, como criou um cisma num dos eleitorados-âncora do PS: os funcionários públicos. Embora correto na decisão de não ceder em toda a linha política a este grupo de interesse, na verdade ficou a ideia que era mais teimosia do que convicção. Acresce que, por interesse próprio, apostou tudo nos descamisados, por definição mais próximos do Chega ou da CDU.

Luís Montenegro tem, por isso, boas hipóteses de durar a legislatura, embora tendo de negociar no Parlamento uma parte relevante das medidas. O facto de a esquerda ter sofrido uma derrota histórica obriga PNS — e depois, provavelmente, José Luís Carneiro — a fazer uma oposição sob o signo do Xanax, até o sangue voltar a circular no partido, porque para já está nos cuidados intensivos com todos os alarmes a piscar.

Claro, teria sido útil à AD que a IL tivesse conseguido o resultado que prometia. Mas falhou. Rui Rocha delirou com grandes ideias, mas vai para casa com uma inegável decepção. Será ele o melhor líder para a IL? Vamos ter umas belas noites de facas longas entre os liberais.

Sobre o Chega, é o que é, e nós somos o que somos. Esta filosofia barata para explicar a subida de um partido com lastimáveis ideias e péssimas contas. O facto de a Constituição poder ser revista, com dois terços de maioria (a confirmar) no centro-direita, talvez seja uma alavanca para ir gerindo Ventura. O Chega meterá umas tralhas patrióticas, talvez até nacionalistas, na Constituição, uns pós de ideias securitárias e, tudo misturado, isso já dá para encantar a claque deliciada dos cheganos, além de dar alguma tranquilidade a Montenegro. Claro, se nos livramos de algum perfume de museu na Constituição, ganharemos o odor fétido da direita-radical.

P.S. Pedro Nuno Santos cometeu um monumental erro político — verdadeiro suicídio — ao deixar-se ir para eleições. Talvez seja um sinal da falta de calma que deixa transparecer demasiadas vezes. Uma má característica para liderar um partido ou o país.