O futebol profissional serve de referência positiva para quase nada, mas esta semana o país assistiu a um gesto de inesperada nobreza desportiva e política. Frederico Varandas, presidente do Sporting, não se deixou intimidar pela multidão de adeptos que vaiava Carlos Moedas na praça do Município, em Lisboa, e soube colocar os pontos nos is: a decisão, errada, de fechar cafés e restaurantes à volta do estádio no último jogo do campeonato, pertenceu à PSP, não à Câmara, que jamais poderia correr o risco de contrariar a sugestão precipitada da polícia. Varandas teve a coragem de dar a mão em público a Moedas, um gesto difícil, raro e limpo de motivações partidárias.
Finalmente, o presidente do Sporting elogiou a competição renhida com o Benfica e fez esta referência sem um pingo de sarcasmo ou sonsice. Num meio, o do futebol, que se autodefine demasiadas vezes pela grosseria, o líder do clube lisboeta mostrou que é possível ganhar sem humilhar, é possível vencer sem converter o êxito desportivo num delirante choque de civilizações destinado apenas à autopromoção. Varandas sai muito bem desta fotografia, embora este gesto exija continuidade para ganhar lastro e densidade.
Por um segundo, imaginemos que, seguindo o exemplo do Sporting, PSD e PS habituavam o país a algum decoro, elevação e sentido de exigência na refrega partidária. O Chega diria que os dois partidos – o malvado bloco central – estariam feitos um com o outro, mas contra isso não há nada a fazer: já todos conhecem a perfídia de Ventura. O importante seria PSD e PS (e os outros também) recalibrarem argumentos e a maneira de fazer política partidária: menos gritaria e mais trabalho sério – e até recatado. A extrema-direita está ao virar da esquina. A economia global soluça. Portugal tem mesmo de deixar de beber do poço envenenado do Chega. A UE não é um seguro vitalício.