A situação mudou, e não foi para melhor. Sem rodeios, a presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde, deixou o aviso esta semana no Fórum BCE, em Sintra: “O futuro é mais incerto – e essa incerteza provavelmente tornará a inflação mais volátil” . Para o BCE será mais desafiador conduzir a política monetária e cumprir o mandato de manter os preços estáveis, exigindo que atue com mais firmeza para manter a inflação em torno de sua meta de médio prazo de 2%.
Vivemos tempos complexos. Nos últimos quatro anos, não só assistimos a um aumento da inflação, como também algumas características estruturais fundamentais da nossa economia e do ambiente inflacionário estão a mudar: “a geopolítica, a digitalização, o uso crescente da inteligência artificial, a demografia, a ameaça à sustentabilidade ambiental e a evolução do sistema financeiro internacional”, alertou Lagarde. Tudo isto levanta questões difíceis de responder.
Do encontro na Penha Longa, com académicos, analistas e banqueiros centrais, saiu uma mensagem essencial para os cidadãos da zona euro. O novo ambiente suscita muitas razões para preocupação e o BCE não pretende recuar um milímetro. A sua presidente deixou isso claro ao sublinhar que fará “o que for preciso” para controlar a inflação, parafraseando Draghi quando, em 2012, garantiu que o BCE estava “preparado para fazer tudo que for preciso para preservar o euro”.
Lagarde reedita o “whatever it takes’”, agora, sem uma crise da dívida soberana, oferecendo aos mercados mais uma garantia incondicional em relação à ação a tomar pela autoridade monetária da zona euro. O BCE, diz, reserva-se o direito de escolher se, como e quando utilizar os instrumentos à sua disposição para responder de forma eficaz e flexível a possíveis novos choques.
A primeira dessas escolhas será feita na reunião de 24 de julho, numa altura em que futuro dos juros do BCE é menos claro, podendo assistir-se a uma pausa no corte de taxas para esperar que se dissipe a névoa em torno das negociações comerciais entre os EUA e a UE. O consenso generalizado é de que a margem de redução é cada vez mais curta, após o oitavo corte consecutivo de taxas para 2%.
O aumento dos preços está quase domado, mas Christine Lagarde reiterou esta semana que há cada vez mais riscos para a estabilidade, com o Conselho do BCE a não se comprometer com uma trajetória de taxas específica, especialmente nas atuais condições de excecional incerteza.
As tensões comerciais mantêm-se. A economia da zona euro permanece fraca, embora resiliente, o que levou o BCE a reforçar a trajetória de descida das suas taxas diretoras. Resta agora saber se o fim do ciclo de cortes dos juros do BCE será, ou não, remetido para depois do verão. Os sinais são de uma mudança de tom a favor de uma paragem iminente do ciclo de alívio dos juros. Mas, tendo em conta os riscos e ameaças que pairam sobre a economia, permanece a incógnita: o BCE terá de descer as taxas mais uma vez?
Para já, a única certeza é a promessa de que o BCE vai ser “a âncora de estabilidade num momento de incerteza”. E fica a garantia de que tem instrumentos na sua caixa de ferramentas para lidar com “a montanha-russa” da inflação no futuro, caso seja necessário. ‘Whatever it takes 2.0’!