A poucas semanas das eleições europeias, a cinco meses das legislativas e com um Orçamento do Estado (OE) assumidamente eleitoralista, o ano político tem sido marcado pela falta de conjugação de interesses dos parceiros de esquerda, que vão muito além das diferenças ideológicas ou programáticas.
Sobram exemplos, à vista de todos os portugueses, que demonstram bem o jogo do gato e do rato mantido entre o PS e o BE, com este a fazer anúncios públicos de acordos conseguidos com o Governo sobre temas críticos e o Executivo a vir a público desmenti-los.
O mais recente exemplo é o da Lei de Bases da Saúde, em que supostamente estaria previsto o fim das PPP na saúde: o BE anunciou a 22 de abril pela voz da sua líder um acordo com o Governo para pôr fim às PPP e às taxas moderadores. E eis que o Governo, dois dias depois, entrega ao Parlamento propostas de alterações que nada proíbem, apenas condicionem… Um caso político com contornos rocambolescos, com a ministra da Saúde Marta Temido a assinar alterações com data de final de março que impunham o fim das PPP, para satisfazer as pretensões do BE.
Falamos, pois, de uma mudança do Governo em menos de um mês. Uma cambalhota e a prova de que o Governo se mantém firme no seu estilo cata-vento. São, portanto, vários os episódios de recuos políticos do PS após avanços públicos bloquistas, que prejudicam não só a credibilidade do Governo, mas os interesses nacionais.
Já em outubro de 2017, nas negociações do OE para 2018, o BE avançou com uma proposta para aplicar às empresas produtoras de energia renovável, a contribuição extraordinária para o setor energético. O objetivo desta medida era reduzir o preço da eletricidade, mas o PS protagonizou um volte-face em nome da aposta nas renováveis e da possibilidade da litigância jurídica em torno do tema.
E quem não se lembra da famosa taxa Robles de setembro de 2018 (assim denominada na sequência do caso de especulação imobiliária em que este dirigente se viu envolvido), onde o BE anunciou que estava a negociar com o Governo desde maio uma medida para “penalizar” os especuladores do setor imobiliário com uma nova “taxa de IRS” e o PS, uns dias depois, veio rejeitá-la, sem grandes explicações?
Ou o episódio dos aumentos salariais previstos na proposta de OE para 2019, que contemplou anúncios e contra-anúncios da gerigonça e que resultou numa discriminação entre funcionários públicos e trabalhadores privados, com salários mínimos diferenciados?
E isto para não falar dos exemplos da contagem do tempo de serviço dos professores, as questões dos enfermeiros, a retribuição dos juízes acima do salário de primeiro-ministro. São inúmeros os exemplos de incoerência a que os portugueses têm assistido neste jogo de corre, foge e esconde. As divergências da gerigonça tornam os portugueses no elo mais fraco, nos protagonistas de um quadro de incertezas. O Governo vive com os olhos postos nas eleições, sem nada fazer para contrariar a degradação dos serviços públicos, da educação, dos transportes, da saúde, da justiça. A geringonça já não tem pernas para andar.