A vida está bastante difícil para aqueles que poderíamos chamar de personalidades criativas — indivíduos dotados de uma propensão natural para responder aos desafios do seu tempo de forma autónoma e inventiva. Falamos daqueles que ousam avançar contra a corrente e insuflar vitalidade em maiorias tendencialmente mais passivas e expectantes – seja no campo das ideias, seja no campo do engenho técnico ou das artes. O nosso tempo mostra-se implacável com esses espíritos de entusiasmo raro: esmaga-os sob o peso de um sistema de controlo totalitário e homogeneizante cada vez mais amplo.

A neutralização das vozes dissidentes manifesta-se tanto de forma directa, através de mecanismos jurídicos e administrativos, como de modo difuso, pela fúria intolerante das massas moldadas por uma pedagogia do conformismo. Vivemos mergulhados no paradoxo de uma sociedade que se proclama guardiã da liberdade, mas que, na realidade, se encontra bastante cativa nas dimensões mais essenciais da existência – aquelas que permitem ao ser humano traçar o seu próprio destino e expressar livremente o seu pensamento em público.

Completa-se agora exactamente um mês desde que o activista conservador Charlie Kirk foi impiedosamente assassinado perante uma plateia de milhares de pessoas e diante de câmaras que permitiram difundir, de imediato e mundialmente, as imagens aterradoras do disparo fatal que o atingiu no pescoço. Este assassinato levanta muitas questões importantes sobre a nossa época, mas comecemos por pensar no tipo de reacções que este episódio despertou. Será que alguém ainda o sente, um mês depois, como verdadeiramente chocante? Creio que poucos. E o que é que isto diz da nossa época?

Em primeiro lugar, diz-nos que existe uma banalização de violência que gera uma dissociação das pessoas com a realidade, entorpecendo-as emocionalmente. Em segundo lugar, relembra-nos de que, terminada a vida terrena, somos facilmente esquecidos pela voracidade do tempo, especialmente em sociedades hiperindividualistas. Revela ainda que os meios de comunicação são um poderoso instrumento de poder, pois conseguem distorcer os factos para transformar um presumível assassinato político em algo irrelevante, insignificante, ou até em algo justificável com base no posicionamento ideológico e religioso da vítima em causa. Esta tendência hedionda de justificar ou festejar este assassinato só é possível graças a todo o deplorável trabalho mediático e intelectual de demonização permanente das ideias da nova direita conservadora.

Por fim, a indiferença social perante a morte de um jovem conservador que primou por manter uma postura muito cordial e paciente em todos os debates, demonstra-nos que vale sempre a pena sermos fiéis aos nossos valores, sem medo do que os adversários possam pensar do nosso estilo, pois quando estes tiverem a pretensão de desumanizar uma determinada pessoa, irão sempre fazê-lo, mesmo que precisem de recorrer à mentira, aos métodos mais desonestos e, por fim, desembocando no fácil incitamento à violência.

Mas esta indiferença, ou falta de solidariedade, perante a morte de Kirk também nos diz algo mais… diz-nos que a sociedade está viciada em inspeccionar as ideias de cada pessoa antes de decidir dar-lhe autorização para respirar, para falar, para socializar, para exercer cargos políticos, para divulgar conteúdos digitais e, no limite, até para viver! Este é exactamente o resultado daquela cultura que Kirk tentava combater nas universidades norte-americanas, ao apelar à responsabilidade individual, à busca pela verdade e princípios de saúde e vitalidade do ser humano, à liberdade de expressão, ao retorno aos valores fundadores e, sobretudo, à autonomia da família como pilar moral e cultural.

Já é suficientemente inquietante viver numa sociedade que se dedica a pesar e censurar as ideias alheias, decidindo, mediante isso, quem merece ser defendido — e quem merece o próprio ar que respira. Pior ainda é ver essas ideias distorcidas, retalhadas e espalhadas com má fé pelos escarnecedores, até que nada reste delas senão a caricatura.

Regressando à nossa ideia de partida, a vida das personalidades criativas está mesmo muito difícil, pois as nossas sociedades encaram com relativa naturalidade o avanço da mais implacável distopia em matéria de perseguição às ideias. Isso é notório, por exemplo, quando alguém responsabiliza o mensageiro alvejado pela sua própria morte, pelo simples facto de ter ousado debater num contexto hostil.

A passividade face à distopia também fica evidente no silêncio que cai sobre a Europa à medida que o Reino Unido é trespassado diariamente por um disseminado regime de censura nas universidades, no mercado editorial, na actividade partidária, no discurso online e no espaço público em geral. É uma realidade quase inacreditável, em que publicações nas redes sociais levam a milhares de detenções por serem consideradas “potencialmente prejudiciais”, “desinformação” ou “fonte de ansiedade”. Apesar do avanço desta experiência distópica, as pessoas continuam a confiar que só acontece no país dos outros, na casa dos outros, assim como aconteceu a Charlie Kirk e é como se nada fosse.

A verdade é que, pouco a pouco, as mesmas tentações vão avançando também por cá, pois o poder político tem consciência de que está a decorrer uma transformação profunda, em que as redes e os meios digitais descentralizados são os novos laboratórios de pensamento e de mobilização social. É nesse modelo horizontal, fora da autoridade central do Estado, que nasce a criatividade política e cultural de quem anseia por referências morais estáveis, e por cumplicidade colectiva na busca de fortes princípios éticos. Apesar dos inevitáveis riscos, de ruído e polarização, essas comunidades digitais funcionam como incubadoras de pensamento crítico e de pertença simbólica à experiência vivida, num mundo que tende a atomizar os indivíduos e a torná-los cínicos, desanimados e desencarnados.

É precisamente o confronto de ideias, a pluralidade de grupos, associações e movimentos dissonantes, que constitui o verdadeiro termómetro da vitalidade de uma sociedade; a polarização, quando mediada pelo debate público e pela liberdade de expressão, não é necessariamente corrosiva, mas frequentemente produtiva, obrigando à clarificação de posições e prevenindo a estagnação intelectual.

É em sociedades excessivamente dependentes do aparelho do Estado, acomodadas aos pequenos confortos, e com uma sociedade civil debilitada, que os espíritos livres – aqueles que pensam fora da caixa, que agitam as águas e desafiam consensos – são olhados com suspeita e hostilidade, e em que a queda de um dissidente inspirador pode ser recebida não apenas com silêncio, mas com um inquietante regozijo por parte daqueles espíritos agrilhoados, incapazes de compreender a alegria do risco, a beleza da aventura e a entrega generosa a causas que transcendem o próprio eu.