A 25ª. Cimeira da SCO – Organização de Cooperação de Xangai (sigla em inglês), realizada em Tianjin/China de 31/08 a 1/09 (2025), não foi abordada, na devida altura, infelizmente, porque aconteceu a tragédia do Elevador da Glória, em Lisboa, que mereceu a prioridade, apesar da muita informação preocupante que continua a ser ocultada, por quem não devia, na tentativa deste período eleitoral passar incólume. Depois, deu-se a revolta da Geração Z no Nepal e o seu tratamento, por pouco se ter falado nos media, em Portugal.

1. A Cimeira25 constituiu o maior encontro de líderes organizado pela SCO até à data. Presença de 20 Chefes de Estado (os 10 Estados fundadores[1] e outros tantos parceiros) com a presença de António Guterres, Secretário-Geral da ONU.

A mais importante, dinâmica e resolutiva Cimeira, desde a sua fundação em 2001, marca um ponto de inflexão importante: gerou-se um espaço onde a convergência e a partilha de valores constituíram o foco principal, que ficou materializado num Manifesto de conteúdo Multipolar, na afirmação da necessidade de reforma das Instituições mundiais ligadas à ONU (linhas próximas da posição defendida pelos BRICS), um pacto de segurança e a definição da cooperação na cultura como um ponto chave. Quase podemos falar na “metamorfose” de uma organização de cooperação regional numa outra de natureza internacional, “não ocidental”.

Esta Cimeira25 emitiu um sinal estratégico ao Mundo que, talvez, se possa sintetizar da seguinte maneira:  estamos, aqui, na disposição de questionar e combater as taxas alfandegárias impostas que, em nada, contribuem para o progresso e bem-estar regionais e mundial e nada têm de racionalidade económica. Estamos, aqui, no combate às medidas dos EUA que ferem os interesses das populações de todos os continentes, e vão contra a inteligência. Estamos, aqui, empenhados em lançar as bases de uma organização mundial diferente. Queremos um mundo onde a Multipolaridade seja o guião estruturante dessa nova ordem.

Na verdade, Trump não dita as suas decisões por razões económicas, mas por razões claramente políticas. A título de exemplo, as taxas impostas ao Brasil decorrem de os tribunais brasileiros terem decretado uma pena de prisão a Bolsonaro, amigo de Trump, contra a tentativa fracassada de golpe constitucional ou à India porque não seguiu a vontade de Trump de não comprar petróleo à Rússia mais barato ou ameaças à União Europeia neste mesmo sentido. Este último exemplo merece um comentário. A UE ficou toda a tremer e logo correu a agradar ao chefe. A submissão europeia, apesar de maltratada, é um dado.

Ainda há dias, lia num estudo de um think-tank europeu sobre as relações EUA/UE que o afastamento dos EUA que, aliás, já vem de trás, só agora explicitada sem requintes por Trump, será para continuar com presidentes republicanos ou democratas. Desde há muito se conhece que a União Europeia é tida como parceiro, de segundo nível, para os EUA. A Europa “sabendo” isso, devia ter assumido uma estratégia de autonomia para quebrar “o enredo” em que se deixou cair e agora não consegue dele sair, com inteligência. Anda perdida e quem assim anda, de uma maneira geral, só comete erros graves e não aproveita as janelas que se abrem, por hipótese, fazendo alianças, para responder às taxas de Trump.

Para os EUA o que conta é a Ásia e, mesmo aí, a agir de forma bruta está em perda de terreno no Mundo e, cada vez mais, porque trocar a diplomacia pela força não é um bom caminho.

Pelos meandros da Cimeira Índia- China

2. É de relevar que a reunião entre Narendra Modi e Xi Jinping, durante a Cimeira – depois de 7 anos – tem de ser analisada com bastante mestria. Os dois países pouco se falavam desde as tensões fronteiriças de 2020.

Mas as mudanças a nível planetário e as consequentes incertezas estão a levar as relações entre estes dois países num caminho de aproximação, a indicar para outra realidade mais ajustada às circunstâncias actuais e futuras. Aliás, esta reunião foi preparada previamente por uma visita do ministro dos negócios estrangeiros da China à India, o que revela uma maior atenção das duas partes aos tempos em mudança.

Na reunião que decorreu entre os dois políticos contam os Media que Xi disse a Modi: “A China e a Índia devem ser parceiros e não rivais”. E Modi destacou que, entre os dois países, existe, agora, “um ambiente de paz e estabilidade” e, logo, medidas concretas foram anunciadas como a retoma normal de voos entre Índia e China, suspensos desde 2020. Xi, por seu lado, avançou com a necessidade de as duas nações desenharem uma estratégia de cooperação a longo prazo, reforçando que serem amigos é “a decisão correcta para ambos os lados”. Há informação de que as terras raras também foram assunto alvo da reunião, dados os recursos potenciais da Índia e o domínio da tecnologia chinesa da fileira.

China, Índia e Rússia

3. Vários analistas conhecedores da matéria entendem que estes três países estão a aprofundar as relações de forma eficaz. Até há quem os denomine de “triângulo de potências unidas em desafio”.

Contudo, esses mesmos analistas avançam que, apesar das múltiplas críticas comuns à política externa de Trump, não se poderá dizer que o triângulo constitua uma aliança anti Washington, pois a diplomacia de cada país cultiva um amplo espaço de manobra próprio.

Também neste domínio à margem da Cimeira, foram estabelecidos acordos bilaterais designadamente nas áreas da energia, designadamente o estabelecimento de contratos de longo prazo na compra e analisada a problemática do seu transporte por terra e mar.

Breve resumo

4. Esta Cimeira25 da SCO proclama um modelo futuro para o Mundo, assente na Multipolaridade/Multilateralidade, o que exige alterações substanciais ao nível da ONU e suas Instituições como o FMI, Banco Mundial, apresentando-se estas reformas como uma forma alternativa de governação.

Aliás, vários documentos foram aprovados neste contexto, que vão nesse sentido. Desde logo, a Declaração de Tianjin, a Estratégia de Desenvolvimento da SCO para 2035 e 24 documentos sobre temas diversos como a segurança, cooperação económica, intercâmbios culturais e institucionais.

A orientação e efeitos desta Cimeira certamente não ficaram indiferentes ao Ocidente, aos seus políticos, mas ainda a várias instituições como a Banca, onde se destacam os bancos suíços que dedicaram algumas análises divulgadas em publicações a que estão ligados, como a “Allnews”, realçando o seu impacte em termos de mudanças a nível global.

Cada vez há mais organizações a funcionar que “incomodam” o Ocidente, designadamente porque lhe são autónomas e lhe reduzem o espaço de manobra, não podendo deixar de referir, entre elas, os BRICS, agora denominados de BRICS+, devido à integração recente de novos membros e à sua cada vez maior influência no Mundo.

[1] Os 10 países membros da SCO são: Bielorrússia, Cazaquistão, China, Índia, Irão, Paquistão, Quirguistão, Rússia, Tadjiquistão, Uzbequistão.