A ministra da Saúde, Ana Paula Martins, há muito que esgotou a reservas físicas, mentais e ministeriais. É importante recordar que Marta Temido, a certa altura, caiu literalmente para o lado, a pressão tornara-se insuportável e o corpo pagou a fatura. O SNS está sem rei nem roque há mais de uma década e a multiplicação de agendas ideológicas, à esquerda e à direita, contaminam a gestão eficiente de um sistema definido pela máxima complexidade e por escolhas eticamente exigentes: até quando salvar uma pessoa, quanto gastar para dar apenas mais uns meses de vida a alguém?
Marta Temido saiu derrotada, entrou Manuel Pizarro sem se dar por ele e, agora, temos a AD a gerir a degradação hospitalar. O que mudou? Pagando cara a demagogia cultivada com esmero na oposição, o PSD não resolveu nada e viu agravar-se as tendências de esgotamento que vinham de trás. Ana Paula Martins chegou ao fim da linha e, talvez por isso, decidiu arranjar um almirante de serviço para boia de salvação – neste caso, o juiz Carlos Alexandre, o antigo poderoso chefão do DCIAP, que assim volta a poder usar a luzidia estrela de xerife único da paróquia. A vantagem é que o antigo juiz de instrução – que juntava “mata” aos pedidos de “esfola” do MP – meterá respeito e medo a muita gente. O problema é que esta espécie de prémio de carreira (entregue por um partido… a um juiz) é dada a uma das caras mais radicalizadas da magistratura.
Carlos Alexandre pisou várias vezes o risco, jamais foi o juiz das liberdades, assumiu-se como a extensão caricatural dos desejos de alguns elementos mais pesados do Ministério Público, com consequências funestas para pessoas e empresas envolvidas em investigações insustentadas. O facto de saber nada de saúde e o facto de ser um juiz – e não um investigador – resumem esta nomeação a um sintomático ato de relações públicas que pode dar certo ou terrivelmente errado.
Sim, a ministra fez o que pôde, foi vítima do contexto herdado, das decisões telecomandadas por terceiros – que teve de aceitar… – e da sua inexperiência no quadro alargado da saúde. Ela está no limite das suas forças, está por um fio, carece de autoridade, deveria ser substituída o quanto antes (com o justo agradecimento: esforço não faltou) porque nada mais pode fazer, como confirma a nomeação de uma não testada vacina justiceira para que faça o trabalho que bons gestores hospitalares (que quase não há), acompanhados pelos respetivos órgãos de fiscalização, deveriam fazer. Novamente, estamos perante a infantilização da política. A saúde passa para a tutela desta espécie de justiça ad-hoc de contornos intrinsecamente vagos. O mito do homem-forte é a panaceia dos países que desistem de procurar soluções políticas sérias. André Ventura não faria melhor. A lei do mais forte não é lei nenhuma.


