Todos nós temos aquele amigo que se assemelha ao Estado nos seus comportamentos. É inevitável, arrisco dizer, impossível, que haja alguém que não tenha um amigo, no mínimo, com uma faceta do Estado. Seja de dia ou de noite, estas facetas tendem a revelar-se comportamentos regulares. Recorrendo à teoria da aprendizagem social de Bandura, e tendo o Estado como uma importantíssima instituição social, tornam-se evidentes estas semelhanças passadas socialmente pelo exemplo de medidas governamentais e atitudes de ilustres figuras do nosso país.
Para ser mais fácil identificar esta galeria de amigos, criei a seguinte tipologia:
#1 O protetor
Os amigos verdadeiros querem o nosso bem, sabemos isso. Mas há aqueles que abusam um bocadinho da sua boa-fé. O amigo protetor é aquele que para além de te dar conselhos saudáveis e incentivar-te a ter um estilo de vida saudável, deixa-te dez notificações de mensagem a dizer que o ginásio tem saudades tuas, tenta impingir-te produtos da Prozis por todos os canais de comunicação possível e ainda tapa os olhos do teu irmão mais novo quando passa um anúncio da Coca-Cola.
“O que foi?! Isto nem devia passar na televisão a esta hora! Mas este tipo de publicidade já passa em horários familiares? É uma vergonha!” Não, não estou a falar de coisas para adultos, mas de coisas para maiores de 16! Podem dizer a este vosso amigo que não vai ter de se chatear por muito mais tempo. Ao que parece, a publicidade a produtos açucarados dirigida a menores de 16 vai ser proibida. Fazer 18 anos torna-se assim algo obsoleto no que diz respeito à liberdade que se ambiciona. Haverá maior liberdade do que ver televisão sem filtros? Sweet sixteen.
#2 O “Fumador Social”
É aquele que divide o mal pelas aldeias. É parecido com o amigo protetor, já que é facilmente identificado por utilizar regularmente o argumento: “É pela tua saúde!”. Este tipo de amigo costuma revelar-se mais durante as saídas à noite. Diz que não fuma, que é só socialmente e que para quando quiser. No entanto, sempre que compras um maço de tabaco já sabes que metade é para ele. Se sentes que és o patrocinador oficial desse teu amigo, fica a saber que a culpa não é só dele.
Não é novidade que os impostos indiretos foram uma das minas da presente legislatura. Seja no tabaco, na gasolina ou nos açúcares, tudo aumentou. Ou é pela nossa saúde ou é porque devíamos andar mais de transportes públicos. A verdade é que o vazio que sentimos na carteira é tão grande como o espaço que o teu amigo deixou no teu maço.
#3 A Diva Alternativa
Esta é aquela amiga que dá nas vistas em qualquer festa e que te quer ajudar a escolher o outfit perfeito para todas as ocasiões. Combinações de estilos diferentes é com ela, mas antes de saíres de casa vê se não estás de fato e chinelos.
Quem não se lembra da secretária de Estado da Defesa Nacional, junto do Presidente da República, num evento formal, de fato e sandálias/chinelos? Ou do primeiro-ministro António Costa de calças de ganga? Foram apenas alguns dos episódios de moda protocolar alternativa que vimos. Nova organização parlamentar, nova moda protocolar. Levaram isto a sério.
#4 O “Não fui eu”
Aquele amigo que quando as coisas dão para o torto se finge de morto. Esta frase é o suficiente para terem um nome apontado. Num momento muito crítico em Portugal, quando se pedia responsabilidades políticas dada a catástrofe dos incêndios e o roubo de Tancos, António Costa foi de férias. De férias. E ainda julgam o vosso amigo por não vos proteger em momentos de crise? Os exemplos vêm de cima.
#5 O amigo irmão e o irmão amigo
Frases como: “Os amigos são a família que escolhemos” ou “Pedi um amigo, recebi um irmão” (também funciona ao contrário), lembram-nos deste tipo de amigo. É como se fosse da família, lá em casa sabe de cor o caminho até ao frigorifico e são os meninos das nossas mães.
Como não poderia deixar de ser também esta prática é recorrente nos nossos ministérios. Os primos, os irmãos, os sobrinhos, todo e qualquer grau de parentesco parece ser fator preferencial no nosso Governo. Nesta lógica, o que é que pode ser melhor do que um irmão que também é um amigo? Ter a família toda no Governo. Fica tudo em casa.
#6 O Flop
Este é aquele amigo que tem sempre boas intenções, mas cujas ideias acabam por ser desastrosas. O que diz para ires lá jantar a casa mas esqueceu-se de ir às compras, ou que te convida para ir lá dormir e ocultou a parte de ter convidado mais dez pessoas. Acabas a dormir no chão e é se queres. É mais ou menos o que se passa atualmente no Sistema Nacional de Saúde. Infelizmente, também não há camas para todos.
#7 O Esbanjador
É o primeiro a ter iniciativa para se organizar alguma coisa no grupo mas também só consegues estar com ele uma vez por mês. No restaurante pede todas as entradas da carta, pergunta ao empregado “qual é o vinho mais caro que têm?” e pede sempre o melhor prato, mas, no final, a conta é a dividir por todos.
Só no primeiro semestre, os gastos do Estado com assessores jurídicos chegaram a mais de 80% do que no mesmo período em 2018. A fatura também é a dividir por todos!
#8 O Engraçado
“Estás a falar a sério ou a brincar?” Nunca temos bem a certeza por tão irónico que este amigo consegue ser. Às vezes chega até a ser constrangedor pela avaliação que faz dos momentos em que decide mostrar a sua veia humorística.
Mais uma vez, António Costa dá o exemplo deste amigo. Numa reunião pública com o reitor da Universidade de Lisboa disse que gostava sempre de voltar à universidade, ainda para mais quando o reitor envia sempre trabalhos para casa. Riso geral. Mas será que teve nota positiva?
#9 O que está sempre online
Os sítios onde vai são escolhidos a dedo. Mas também está sempre com o dedo a fazer scroll no Instagram. Pede-te constantemente likes, partilhas e comentários e pergunta sobre o melhor filtro para a próxima foto que vai partilhar nas redes sociais. Num jantar, é mais fácil que te responda por mensagem do que pessoalmente. O protagonista deste exemplo é alguém que fez uma reportagem fotográfica a acompanhar atentamente os incêndios em Portugal… pela televisão. Lembram-se de alguém? Também foi o nosso primeiro-ministro.
#10 O Esquecido
O amigo que tem memória de peixe. Utiliza muito a expressão carpe diem para colmatar esta sua falha, mas acabamos sempre por ser nós a lembrá-lo de tudo. É também o caso do atual Governo, caminhando num sentido muito idêntico ao do governo de José Sócrates. Os ministros de hoje, foram os mesmos que nos presentearam com uma bancarrota, mas parecem ter sido submetidos a uma intervenção que apaga a memória, tornando-a seletiva, que é como quem diz, lembram-se daquilo que lhes convém.
Tendo já identificado dez tipos de amigo, resta dizer que estes são uma fotografia daquilo que seria o Estado se este fosse uma pessoa e de que forma se relacionaria connosco. Parte das nossas vidas, presença inequívoca no nosso dia a dia, como amigo é intrometido nos assuntos que não lhe dizem respeito, mas é parte fundamental da nossa sociedade.