Um pouco por todo o Mundo, mais de 40 países, bem como uma mão cheia de cidades americanas, introduziram, ou estão a considerar introduzir, impostos sobre bebidas açucaradas. São essencialmente dois os objetivos. Para além de arrecadar receitas, estes instrumentos visam alterar o consumo de bens cujo preço não reflete os seus verdadeiros custos sociais, tornando-os comparativamente mais caros. Os impostos sobre o tabaco e o álcool são exemplos clássicos. O mesmo racional aplica-se: o consumo excessivo de açúcar está associado a uma maior prevalência de doenças (como, por exemplo, a diabetes) e, consequentemente, maiores encargos para o serviços de saúde.
A recente popularidade dos impostos sobre bebidas açucaradas não está isenta de críticas. Em 2016, o senador Bernie Sanders escreveu uma carta aberta contra estes impostos por serem regressivos e socialmente injustos. Do outro lado do espetro político, muitos acusam-nos de ser demasiado paternalistas e de imporem restrições à liberdade individual. Esta disputa torna fundamental estudar o impacto desta tributação, tendo em conta as especificidades e o contexto. É precisamente essa a motivação de um artigo que elaborei em co-autoria com a economista da saúde Judite Gonçalves.
Com a Lei do Orçamento de Estado para 2017, o governo português criou um imposto sobre as bebidas não alcoólicas adicionadas de açúcar e outros edulcorantes que entrou em vigor a 1 de Fevereiro de 2017. Como o nome indica, ficaram isentas as bebidas alcoólicas, os sumos de fruta e o leite mas foram incluídos os produtos diet e zero. Foram ainda considerados dois escalões de tributação, aplicando uma taxa substancialmente maior para bebidas com um teor mais elevado de açúcar adicionado. Este pormenor é na realidade um pormaior uma vez que se trata de um incentivo claro à reformulação dos produtos de forma a evitar um maior nível de taxação.
No estudo foram analisados os micro dados mensais, por produto, de mais de 400 super e hipermercados espalhados por todo o país recorrendo a métodos estatísticos que permitem identificar a direção e a intensidade das relações de causa e efeito. O período da nossa amostra extende-se entre fevereiro de 2015 e janeiro de 2018. Foram tidos em conta fatores importantes como a sazonalidade do consumo e a heterogeneidade entre as diversas lojas. Assim, é investigada, separadamente, a evolução do consumo de produtos 1) no escalão superior, 2) que estariam nesse escalão mas cujos produtores decidiram baixar o teor de açúcar para serem taxados no escalão inferior, 3) no escalão inferior com açúcar e 4) no escalão inferior com edulcorantes. O grupo de comparação é constituído pela água engarrafada.
As principais conclusões do estudo podem ser resumidas da seguinte forma. Os resultados sugerem que os benefícios do imposto em termos de redução do consumo de açúcar devem ser largamente atribuídos não à mudança dos hábitos de consumo de referigerantes mas à decisão, por parte de alguns produtores, de alterarem o nível de açúcar em alguns produtos com uma quota de mercado significativa. De qualquer forma, encontramos ainda uma ligeira redução do consumo, principalmente para os produtos com baixo teor de açúcar.
A principal característica distintiva deste imposto implementado em Portugal é então a introdução de incentivos fiscais de forma a que os produtores escolham evitar o escalão de taxação mais elevado através do reposicionamento das suas marcas e da reformulação das receitas. Este modelo parece estar a popularizar-se na Europa tendo influenciado a criação do imposto britânico e a reformulação do imposto francês em 2018.
Para mais informações sugere-se a leitura do artigo Brown sugar, how come you taste so good? The impact of a soda tax on prices and consumption.