A decisão do atual reitor da Universidade de Coimbra, Amílcar Falcão, de eliminar o consumo de carne de vaca nas cantinas da Universidade, a partir de janeiro de 2020, está longe de colher consenso, malgrado o apoio manifestado pela respetiva Associação Académica. Um assunto que vai fazer correr mais tinta do que água leva o Mondego quando secam as chuvas que alimentaram o caudal do Bazófias.

De facto, tudo o que vem da Universidade de Coimbra acaba por ultrapassar as fronteiras nacionais. Uma situação que não decorre apenas do elevado número de estudantes, nacionais e estrangeiros, que se sentaram nos bancos daquela que, durante muito tempo, foi a única universidade de Portugal.

Uma criação que representou, juntamente com a contratação do primeiro Almirante para a Marinha Portuguesa e a plantação do pinhal de Leiria, um passo fundamental dado por D. Dinis no sentido do Conceito Estratégico Nacional. Uma decisão que não demoraria a colher frutos ao possibilitar, pela via do Direito, a manutenção da independência face a Castela na crise de 1383-85.

Uma instituição que soube criar e cultivar o prestígio, graças à qualidade dos seus Mestres. Uma realidade que não sofreu alteração nem com a mudança de regime nem com o surgimento de novos paradigmas universitários. Daí que quando o reitor fala, as suas palavras tenham um peso que não decorre apenas de quem as pronuncia.

Foi assim, por exemplo, quando o reitor Seabra Santos, que esteve no cargo de 2003 a 2011, escreveu, juntamente com Naomar de Almeida Filho, o livro A Quarta Missão da Universidade. Internacionalização universitária na sociedade do conhecimento. Uma obra em que mostrou que não basta à Universidade cumprir, ainda que bem, aquelas que têm sido as suas funções. Numa conjuntura inquieta e desafiante, a Universidade tem de conseguir teorizar o globalismo sem ordem com que a Humanidade se vê confrontada.

Por falar em internacionalização, diga-se que a decisão de Amílcar Falcão vem na sequência daquela que foi tomada por uma instituição de elevado prestígio, a Universidade de Cambridge. Um argumento que os defensores da medida não demoraram a trazer para a praça pública. Um apoio que poderia ter recorrido a outros exemplos vindos do Reino Unido. Como quando Thomas More considerou os carneiros carnívoros porque, devido à sua criação extensiva, eram comedores dos homens que ficavam privados de campos para cultivar. Bastaria trocar os carneiros pelas vacas.

Como é óbvio, também as críticas foram céleres. Acusaram o reitor de pôr em causa o direito à liberdade alimentar dos estudantes ou de estar a esquecer aqueles que só têm acesso a carne de vaca na cantina. Sim, porque apesar dos «milagres» de Centeno, para muitas famílias portugueses o tempo continua a ser de vacas magras.

Apesar da certeza de que os pequenos gestos também contam, é com indisfarçável curiosidade que se aguarda o relatório transdisciplinar que sustentou a decisão reitoral. Numa Universidade com tão conceituadas Faculdades, não parece crível que o reitor tenha decidido por impulso próprio.

Seguro é que não será o desaparecimento da carne de vaca das ementas universitárias que evitará o regresso a esta vaca fria.