(Decidi não escrever sobre qualquer uma das eleições, sejam as legislativas, sejam as para a Ordem dos Advogados. Em qualquer dos casos, a maior parte da campanha eleitoral tem tido como único efeito possível um estado entre o ridículo e o humor delirante, adequados a um qualquer problema de humor mas inaptos para nos representarem. No momento em que muitos dos protagonistas lutam para manter um qualquer poleiro, à esmagadora maioria dos portugueses resta manter-se à tona porque a vida faz-se todos os dias e é muito mais do que uma cruz num boletim de voto, principalmente quando sabemos que no dia seguinte somos esquecidos.)

 

Houve uns tempos em que os Advogados eram considerados elementos integrantes da organização judiciária e peças fundamentais da administração da justiça. Dessa altura, pouco mais restam do que umas memórias e, nalguns tribunais, umas salas recônditas reservadas para estes.

Sei que, por estes dias, o discurso assenta na promessa nunca cumprida da actualização dos honorários pagos nas vulgarmente oficiosas. Contudo, não vou (apenas…) por aí. Os tempos, dizem, são de formulários. Na lógica de simplificação do que, por via de regra, não deve ser simplificado, os Advogados passaram a ser considerados “público, em geral” (seja lá o que isso for), atirados para as casas de banho do dito público e condenados a esperarem pelas suas diligências nos corredores dos tribunais.

O dever de colaboração entre partes, advogados e tribunais está consagrado na lei mas é unidireccional. Quando vivos, os advogados são instados a realizarem actos que competiam a estes últimos, como avisar testemunhas de adiamentos, a facilitarem peças em formato word, a sujeitarem-se a atrasos de terceiros (quando o inverso raramente se passa), a terem uma especialização em informática e a munirem-se da paciência necessária para não partirem o computador quando os prazos apertam e os sistemas não funcionam. Uma vez mortos, segundo algumas decisões recentes, os advogados, eventualmente antes de serem cremados, são obrigados a zelar pelos prazos que já não conseguiram cumprir (sim, leram bem…), sob pena de prejudicarem a parte que neles confiou enquanto estavam vivos.

É verdade que existiram umas pequenas vitórias nestes anos mas que não chegam para inverter o crescente desrespeito que grassa e que tem tornado o que era uma profissão considerada como prestigiada no inferno pessoal dos que a seguiram.

O meu voto em qualquer uma das eleições? Está destinado a ser para os que devolvam a dignidade àqueles a quem compete zelar pelos direitos dos demais. Por mais que tentem convencer o dito “público em geral” de que somos desnecessários. Principalmente quando o tentam. É que, uma vez mais, sei que não vou por aí.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.