Em fevereiro de 2016, o governo apresentou um ambicioso plano de investimentos ferroviários, que previa um pacote financeiro de dois mil milhões de euros para melhoramentos da rede ferroviária nacional, apoiado por fundos estruturais europeus. Esta semana, ficámos a saber da intenção da Infraestruturas de Portugal (IP) de suspender ou adiar 18 obras de renovação da ferrovia consideradas prioritárias no âmbito do programa Plano de Investimentos em Infraestruturas – Ferrovia 2020.
Importa frisar que a liberalização do mercado ferroviário europeu iniciada este ano, com um período de adaptação até março de 2020, representa uma nova realidade para Portugal, sendo óbvio que a CP, com uma oferta manifestamente insuficiente para assegurar as necessidades dos utilizadores, não está preparada para enfrentar os novos desafios.
E importa frisar também que o país, em matéria de transporte ferroviário, não se circunscreve a Lisboa ou Porto, ou Sintra ou Cascais ou outros troços com passes sociais massificados e mais rentáveis do ponto de vista operacional.
Com a decisão que conhecemos esta semana, ficou claro que o Governo assume atrasos e constrangimentos de investimentos considerados absolutamente necessários em 2016 mas que, mais de três anos depois, colocam em standby projetos como a eletrificação ou a conclusão de investimentos na linha do Minho, Douro, Beira Alta e Baixa, Oeste, Sines e Algarve.
A título de exemplo, na linha do Minho, os utentes vão ter de esperar (ainda) mais por comboios elétricos, uma obra que se encontra em curso mas com atraso de dois anos (devia estar concluída no primeiro trimestre deste ano) e, no troço Porto-Vigo, pela eletrificação entre Viana e Valença que, para já, se faz em comboios a diesel. E na linha do Douro, entre a Régua e Marco de Canaveses, a obra foi mesmo suspensa, assim como a renovação do troço entre Válega e Espinho.
Bem sabemos que, em campanha eleitoral, tudo se promete e tudo se faz – recordo a viagem de candidatos a deputados do PS para demonstrar que os calendários das obras estavam a ser cumpridos – mas tem de haver limites. E quando um mês depois da posse do novo Governo surgem os adiamentos, as suspensões e os cancelamentos, esses limites são claramente ultrapassados.
Portugal precisa de um forte investimento público em infraestruturas de transportes, essencialmente ferroviárias internas e de ligação internacional, pois é necessário um esforço de coesão territorial, de correção das assimetrias do país e de valorização dos territórios com mobilidade. Este esforço não pode ficar no papel ou apenas em iniciativas avulsas como a localização de secretarias de estado no interior (e nas áreas de residência dos titulares dos cargos!).
Ainda há três semanas, aquando da apresentação do programa do Governo, António Costa anunciou 22 novos comboios para a CP e a entrada em circulação de 20 comboios parados “há muitos anos”. Agora, surge o revés: adiamentos e mais adiamentos, que em nada ajudam o país a ganhar a competitividade que tanto necessita.
Começa a faltar paciência para tantas promessas que ficam por cumprir e para tantos investimentos públicos que tardam em aparecer. Os nossos impostos estão a servir exatamente para quê?