Nos últimos tempos, tem-se discutido muito a questão da distribuição da riqueza. Dessa discussão resultou a constatação de que a transição de séc. XX para o séc. XXI está a marcar uma mudança na forma dessa distribuição: é cada vez mais assimétrica.
Têm-se produzido relatórios, publicado livros e artigos científicos e a conclusão é sempre a mesma: os últimos 30 anos têm conduzido a uma distribuição da riqueza cada vez mais desigual, em o que o, já famoso, 1% do topo da distribuição da riqueza está a acumular cada vez mais riqueza. Paralelamente, o capital tem ficado com uma parte cada vez maior da distribuição do rendimento (em detrimento do trabalho) e, dentro do trabalho, agudizaram-se as assimetrias entre os muito qualificados em certas áreas específicas (ex: computação e finanças) e todos os outros, e também entre os CEO e demais assalariados.
Percebida esta realidade, levanta-se uma questão política, ideológica e moral: aceitamos essa desigual distribuição como justa ou desenvolvemos estratégias para a combater?
Os libertários aceitarão esta distribuição, pois ela surge das relações económicas internacionais e da competição nos mercados. Dirão até que tudo o que os Estados fizerem no sentido de alterarem tal distribuição só trará efeitos negativos, como o desacelerar do crescimento económico, apesar da evidência empírica não sustentar tal hipótese.
Já os humanistas poderão defender alterações nessa distribuição por considerarem que o facto de 1% da população mundial deter 50% da riqueza implica violações concretas aos direitos humanos, quaisquer que tenham sido as causas dessa acumulação.
Depois, temos ainda as análises científicas sobre os determinantes da felicidade que nos demonstram que distribuições muito desiguais do rendimento e da riqueza causam perdas na felicidade média, uma vez que a maioria das pessoas é prejudicada com a desigualdade extrema. É que, mesmo que existam ganhos absolutos de rendimento para todos, o ficar-se relativamente pior é, no que concerne à felicidade, mais relevante, pois a comparação e o posicionamento relativo são mais relevantes do que o rendimento absoluto (a partir de certos limiares básicos de rendimento).
Perante tudo isto, defender a atual desigualdade torna-se difícil. Então, vendo essa desigualdade como iníqua – porque somos humanistas, sociais-democratas, seguimos a doutrina social da igreja ou queremos maximizar a felicidade humana –, temos que procurar alternativas, que passarão sempre por processos redistributivos: realocar riqueza e rendimento dos 1% mais ricos nos demais.
Esse processo faz-se através do equilíbrio de poderes entre as nações e entre os indivíduos. Para isso, precisamos de fortalecer a democratização nacional e internacional, promover a transparência e o combate à evasão fiscal, desmantelar poderes monopolistas e apostar em fiscalidade progressiva (sobre o rendimento e sobre a riqueza).
Esta redistribuição não só é compatível com o capitalismo, a globalização e o crescimento económico como pode ser a única solução para uma saudável vivência economicamente integrada. Por mais demagogia que os 1% mais ricos tentem impingir, diminuir a desigualdade no mundo contemporâneo é uma condição sine qua non para a sustentabilidade e a felicidade da humanidade.