Para melhor avaliar a evolução do saldo orçamental, faz sentido expurgar das receitas e das despesas os designados factores temporários, não recorrentes e especiais. Tendo por base este critério, conclui-se que nos últimos cinco anos o défice público português diminuiu 10 mil milhões de euros de forma “permanente”, passando de 8,5% do PIB em 2010 para 3% em 2015. Este último valor é o ponto de partida para 2016.
Como se sabe, o Conselho da União Europeia exige a Portugal um défice não superior a 2,5% do PIB para este ano – uma meta que não seria muito exigente caso se verificasse uma forte aceleração da actividade económica. O problema é que o nosso País está a crescer significativamente menos do que aquilo que foi estimado pelo Governo. A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), que deveria assumir um papel preponderante, está a contrair, ao passo que a devolução acelerada de rendimentos não fez disparar o consumo das famílias.
O falhanço da estratégia económica socialista só não está a conduzir a um verdadeiro desastre orçamental porque o Governo agravou um conjunto de impostos e decidiu travar a fundo o investimento público. Com efeito, até Agosto, o Estado já arrecadou com ISP, Imposto de Selo e Imposto de consumo sobre o tabaco, mais 917 milhões de euros do que no ano passado – em igual período de 2015 o aumento foi de apenas 36 milhões. Já as despesas com investimentos, que era suposto estarem a subir, caíram até agora 297 milhões de euros.
Porém, num contexto de acelerada devolução de rendimentos, de diversas reversões e de um pior desempenho da economia, esta austeridade, que já supera os mil milhões de euros, parece ainda assim ser insuficiente para garantir o cumprimento da meta do défice. A prova é que o Governo, que quase jurou a pés juntos que não seriam necessárias medidas adicionais, foi obrigado recentemente a mexer mais uma vez nos impostos (IMI e IUC), encontrando-se agora a cozinhar iniciativas extraordinárias de última hora.
Ironicamente, não é o crescimento económico que está a ajudar António Costa a ficar mais próximo da meta do défice, mas sim a nova página da austeridade que o próprio escreveu a letras garrafais. Brevemente, irá ainda juntar-se ao jogo um reforço de peso que o primeiro-ministro contratou à direita, que dá pelo nome de “Perdão Fiscal”, e que outrora o PS apelidou de “expediente orçamental de vista curta que reforça o sentimento de injustiça e retira credibilidade ao Governo”.
O autor escreve segundo a antiga ortografia.