É bom não esquecer o essencial: este Governo é politicamente ilegítimo na sua origem. E vai-se tornando cada vez mais ilegítimo no exercício. Eu sei que muitos dirão: cá está este com a mesma (e requentada) conversa! Mas é a conversa que convém manter. A memória é curta e os tempos são de coruja. A prova está na invocada “normalidade”, dita em vários tons pelo primeiro-ministro, mas que teima em não acontecer. E não se iludam com os cantos de sereia dos convertidos à “gerigonça”, a maior parte deles vindos do PSD (Pacheco Pereira é talvez o caso mais óbvio).

Mas voltando ao essencial e repetindo o que já aqui escrevi: os portugueses não votaram num governo PS que se sustenta em conúbio com o PCP e BE. Que a “coisa” é constitucional, com certeza. Mas politicamente isso não chega. Carece da legitimidade que resulta do voto popular. E a solução PS/PCP/BE não foi a votos com um programa de Governo comum em 2015. Daí que a “geringonça” procure compensar a fraqueza da sua origem com um exercício do poder mistificador em que o verdadeiro conteúdo das políticas é irrelevante: a forma/mensagem é tudo.

Pura propaganda, ao fim e ao cabo, ajudada por alguma comunicação social e pelos “idiotas úteis” do costume. Ele é, por um lado, o chefe do Governo que nos entra em casa todos os dias, anunciando o “fim da austeridade” e, por outro, a opinião “independente” a criticar a estratégia política do PSD (elogiando a do CDS) e a denunciar o “catastrofismo” de Passos Coelho.

A estratégia é clara: convencer o povo que acabou a austeridade e colar o rótulo de “desmancha-prazeres” a quem duvide do “milagre”. Ora, o verdadeiro conteúdo das políticas económicas deste Governo, dizem-nos os raros comentadores que não vão nas cantilenas governamentais, vai inexoravelmente deixar-nos mais pobres a prazo – ignorando as condições que o anterior governo havia deixado –, pagando a classe média o que pode e não pode para sustentar um Estado falido que só existe ainda porque a torneira do crédito não fechou.

Mas a mensagem que se quer passar – e está a passar – é a de que o Governo de Costa nos libertou das amarras do FMI para o qual Pedro Passos Coelho, sem dó nem piedade, nos havia empurrado. Vejam todos, dizem os governantes, como melhoramos as pensões de reforma (quais?), devolvemos a sobretaxa (quando?), respeitamos o défice europeu (em que ano?) e até oferecemos livros no ensino básico (a quem?). Quem duvidar destas verdades não passa de um “velho do Restelo” amigo do FMI e adepto do “neoliberalismo”.

Pois é, o diabo não está só no “rating da República” e nos juros da dívida. Também está na propaganda.