A discussão à volta do orçamento constitui um dos momentos altos que domina sempre o último trimestre do ano pelas implicações políticas, económicas e financeiras para entidades públicas e privadas. Este ano não foi exceção. O debate tem sido intenso, mas com pouca seriedade.

Evidenciamos sete questões problemáticas em torno do orçamento.

Usura. O Governo de António Costa anuncia a redução da carga fiscal, mas cria um novo imposto sobre o património e fixa novos aumentos nos impostos indiretos. Espera aumento da receita dos combustíveis, do tabaco, do IRC, e desdenha a diminuição do IVA da restauração.

Arrogância. O episódio inaceitável de documentos e tabelas que foram sonegados ao Parlamento pelo Governo e a evidência de valores não correspondentes ao anunciado inicialmente.

Complacência. A crescente dúvida da veracidade das previsões governamentais, a passividade e sistemática desculpabilização dos partidos de esquerda em aceitar os comportamentos desviantes e erráticos do Ministério das Finanças, que contraria o rigor formal com que este ministério sempre assumiu os seus documentos.

Descoordenação. A falta de ligação clara entre a política fiscal do Governo e um evidente desvio da política económica, onde o crescimento se assume como fundamental para os objetivos de desenvolvimento. O Governo falhou redondamente no crescimento para 2016. Já nem o assume para 2017. Onde cresce, e como, fica por evidenciar.

Suspeição. A desconfiança de que existe uma atitude de deslize no pagamento de despesas públicas, nomeadamente na saúde, para não afetar resultados trimestrais, empurrando para longe o endividamento e melhorando artificialmente as contas nacionais. Junte-se a redução do investimento público e das cativações e não se anteveem sinais positivos para o futuro.

Incoerência. A situação incongruente da segurança social. Ainda em 2016 criou-se um mecanismo de receita extraordinária e um perdão fiscal evidente. Enquanto o ministro afirma não haver problemas de financiamento de reformas e pensões, o Governo cria um imposto específico para cobrir as despesas da segurança social. Afinal, o problema não é a prazo, é imediato.

Opacidade. O Governo age permanentemente como se fosse um pronto-socorro ativado em função dos problemas que ele próprio criou. Não age, reage. Sem pejo em manter qualquer coerência, como se viu, nos infelizes episódios da Caixa Geral de Depósitos, onde transparência e atitude foram substituídas por conveniência e secretismo.

Este ano fica marcado por atos de exceção invocados pelo Governo com aumentos nos impostos e nas taxas, na derrapagem dos pagamentos e no perdão fiscal, isto é, soluções meramente pontuais. Este orçamento pulveriza o rigor das finanças. Proporciona o flanco à desconfiança e pactua com jogo de cintura. Esperamos que acertem nas contas, mesmo que não acreditemos nelas.