O principal desígnio de Portugal no horizonte 2030 é transformar os seus ativos de conhecimento e de tecnologia em valor económico que potencie o crescimento e a internacionalização

Ao longo das últimas décadas, através de uma política bem-sucedida de technology push, Portugal conseguiu criar e ativar uma rede de infraestruturas científicas e tecnológicas de bitola internacional. Mais recentemente, através de uma aposta crescente em políticas do tipo market pull, o país tem vindo a conseguir uma aproximação crescente entre a rede de infraestruturas científicas e tecnológicas e o tecido empresarial, nomeadamente com grandes empresas e startups de base tecnológica.

Fruto deste processo, no último European Innovation Scoreboard (EIS), Portugal conseguiu integrar pela primeira vez o grupo dos designados “Inovadores Fortes”, entrando assim num novo campeonato europeu. Note-se que Portugal já está acima da média da União Europeia em indicadores como o número de publicações científicas em coautoria fora do espaço comunitário, o número de estudantes internacionais de doutoramento, o registo de marcas comunitárias, o emprego em empresas de elevado crescimento de setores inovadores, entre outros indicadores monitorizados pelo EIS.

Não obstante este progresso, Portugal permanece na cauda da Europa em matéria de crescimento económico e de PIB per capita. Significa isto que existe um enorme gap de valorização de conhecimento e tecnologia no país. Um estudo recente desenvolvido pela EY-Parthenon para a Agência Nacional de Inovação, centrado na análise da atividade dos gabinetes e infraestruturas de transferência de conhecimento e tecnologia em Portugal, revela precisamente isso: a maturidade do sistema científico e tecnológico nacional em termos de valorização do conhecimento e tecnologia tem uma enorme margem de progresso, sendo ainda poucas as instituições que o integram que apresentam boas dinâmicas neste domínio.

Portugal precisa, portanto, de transformar os seus ativos de conhecimento e tecnologia em valor económico, isto é, em inovação geradora de novos produtos e serviços de elevado valor acrescentado e de processos produtivos altamente avançados. Diria que este é o principal desígnio de Portugal para o horizonte 2030, naturalmente alinhado com os desafios societais e as prioridades europeias associadas à transição para uma economia neutra em termos climáticos e à transição digital.

O Plano de Recuperação e Resiliência (atualmente em discussão pública) e o novo Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027 poderão e deverão contribuir decisivamente para este desígnio. A este nível, importa ter em consideração que é notória a insuficiência em Portugal de instrumentos específicos de promoção da valorização de conhecimento e tecnologia. Por exemplo, não existe no país um bom sistema de apoio à realização de doutoramentos em empresas ou à inserção de doutorados nas empresas. Não existem vias verdes de apoio à industrialização de projetos de I&D. Não existe um bom sistema de apoio a provas de conceito e à validação (económica) do potencial de valorização de projetos de I&D. Não existe financiamento de base nem contratos programa dirigidos a TTOs/OTICs.

Refira-se, por fim, que parte da resposta necessária terá que vir de reformas estruturais nas organizações públicas, designadamente nos centros de conhecimento (e.g. estatuto da carreira docente, estatuto da carreira de investigação científica) e nos reguladores com responsabilidade em áreas ligadas à I&D e inovação. Estas organizações têm que ser impulsionadas a criar os incentivos certos à valorização do conhecimento e da tecnologia e à promoção da inovação nas empresas e com as empresas.