Na audição a que se submeteu recentemente na Comissão Parlamentar de Economia Inovação e Obras Públicas, Margarida Matos Rosa, a nova presidente da Autoridade da Concorrência (AdC) afirmou, reportando-se a um estudo antigo, que por cada euro que lhe é atribuído, a Autoridade devolve vinte à sociedade. E notou que para o mandato que agora inicia, o objetivo é aumentar bastante este ratio.
Cabe louvar a ambição da nova presidente e fazer votos para que a consiga levar por diante. No final do seu mandato será sempre muito difícil quantificar com rigor quanto devolveu a AdC à sociedade, mas teremos uma noção sobre o que foi feito. Mais do que as coimas aplicadas, cujo montante reverte para o Estado em apenas 60%, a AdC devolve valor à economia exercendo as funções que lhe estão cometidas por lei, designadamente as decorrentes dos poderes de supervisão, sancionatórios e de regulamentação de que dispõe. Numa altura em que o crescimento económico parece estar na ordem do dia do debate político, a AdC tem um contributo muito relevante a dar, na medida em que lhe compete zelar pelo correto funcionamento dos mercados, garantindo que as empresas concorrerem efetivamente entre si, numa rivalidade saudável, gerando eficiência, inovação e emprego.
Para alcançar este objetivo, e como tive oportunidade de assinalar noutras ocasiões, há áreas prioritárias em que a AdC tem que ter sucesso. A primeira é a do enforcement. O principal contributo que a AdC pode dar ao país é um crescimento do número de decisões sancionatórias, campo em que tem ficado atrás das suas principais congéneres europeias e onde o atual conselho (que agora tem uma nova Presidente) ainda tem números mais modestos que os anteriores, que adotaram mais decisões desta natureza. Além de endereçar questões concretas de concorrência, o crescimento do enforcement tem uma função de prevenção geral, que é positiva, dado que não apenas as empresas visadas pela AdC mas todo o mercado sentirão a presença da AdC e, consequentemente, uma maior pressão para cumprir as regras do jogo. A segunda área é a das políticas públicas. A AdC não governa nem legisla, mas entre as suas funções encontra-se a análise do impacto concorrencial de políticas públicas e a formulação de recomendações sobre as mesmas. Se queremos mercados concorrenciais, as políticas públicas devem contribuir para fomentar a concorrência e a AdC tem desempenhado um papel de relevo neste domínio com diversas recomendações ao Governo formuladas em diversos sectores, desde a energia, aos transportes ou aos resíduos de embalagens. É importante que esta área da intervenção da AdC se mantenha forte e interventiva, analisando sobretudo sobre as áreas mais estratégicas da economia.
Por fim, a nova Presidente toma posse num contexto particularmente favorável para conseguir resultados. Por um lado, encontra-se praticamente concluída a reforma do quadro jurídico em que assenta a aplicação do direito da concorrência: foi criado o Tribunal da Concorrência, publicada uma nova Lei da Concorrência, aprovados novos Estatutos da AdC e, em breve, será transposta a Diretiva do Private Enforcement, que visa tornar efetivo o direito a ser compensado por infrações às regras de concorrência. Por outro lado, a AdC viu ainda as competências que tinha na instrução de processos por práticas restritivas do comércio serem transferidas para a ASAE, o que é uma boa evolução, dado permitir-lhe concentrar recursos na concorrência. Em terceiro lugar, segundo os dados da Global Competition Review há hoje um conjunto de processos abertos mais significativo do que no passado, o que significa que a AdC “está no terreno” a investigar mais casos. Por fim, a AdC conta hoje com uma experiente estrutura diretiva ao nível dos serviços e mostra capacidade de diálogo com as empresas, factores que são essenciais para assegurar o seu bom funcionamento e a adequada comunicação com o mercado.
No final do mandato da Margarida Matos Rosa não se saberá com rigor quanto devolveu a AdC à sociedade. Mas se tiver dado a devida atenção às suas áreas de intervenção prioritárias, reforçando o trabalho que já tem vindo a ser feito, será, como deseja a nova Presidente, seguramente mais do que devolve no início.