Tanta gente diz mal do Presidente Trump que eu adoraria poder dizer bem. Mas não consigo. Confesso que, como seguramente outros, tinha uma ligeira (muito ligeira, diga-se) esperança de que haveria um Donald candidato e outro Presidente, mas pelos vistos não há. E bastou o discurso fascizóide da sua tomada de posse para perceber que a coerência entre o candidato e o Presidente seria o seu pior defeito.
Trump promete, Trump cumpre. E fá-lo à velocidade de uma assinatura, como se o exercício do cargo político mais relevante do mundo fosse uma sessão de autógrafos de uma popstar americana. A sua grande diferenciação em relação a muitos políticos – cumprir o que promete – está a revelar-se desastrosa.
É inegável que a coerência de Trump continua a agradar a uns quantos que preferem este estilo “quero, posso e mando” aos maçadores “checks and balances” das democracias. É facto que foi a democracia que elegeu Trump, mas enganam-se os que acham que a democracia nasce e acaba numa cruzinha num papel. Democracia é ponderação, é tolerância, é diversidade, é uma permanente gestão equilibrada das diferentes tendências de uma sociedade e é respeito pelos pilares históricos de uma nação. Em apenas 15 dias, Trump demonstrou que ignora esses princípios.
Choca-me que em tantas partes do mundo se sonhe e lute por alcançar regimes minimamente democráticos e livres, e que num mundo ocidental altamente privilegiado em relação a outras geografias se ande a tomar a democracia como garantida e, em alguma medida, negligenciável. Os eleitores andam a comportar-se como aquelas crianças mimadas que tudo lhes é dado pelos pais e acabam por não valorizar nada. Convém nunca esquecer que, por muito desgastadas que as democracias liberais do ocidente estejam, são a nossa grande fonte de prosperidade em relação a outras partes do mundo controladas por regimes de outra índole.
Tive o privilégio de viver uns tempos nos EUA. Na América que conheço um negro há muito que não é um negro, mas um “Afro-American”; um latino (incluindo mexicanos) é um “Hispanic-American”; um árabe é um “Arab-American” e um judeu é um “American Jew”. É esta conjugação de americanos que tem feito a América sempre “great”. São eles que criaram as empresas mais prósperas e inovadoras do mundo, é neles que nascem os artistas mais admirados da cultura internacional e são eles que inventam os maiores desenvolvimentos tecnológicos e científicos da humanidade. É uma América securitária e atenta aos seus múltiplos inimigos, que nos olha de lado na fronteira mas que, passada essa barreira de segurança, é profundamente livre e terra de oportunidades para quem não tem receio da meritocracia.
É também a maior democracia do mundo que leva muito a sério uma pequena Constituição de 1787. O Presidente Trump é, obviamente, livre de optar por políticas mais ou menos protecionistas, mais ou menos sociais e mais ou menos liberais. No entanto, se continuar a “pisar os calos” dos direitos, liberdades e garantias que constituem a essência democrática dos EUA, arrisco dizer que terá mais cedo que tarde o seu merecido impeachment. Podemos chamá-lo de Trumpeachment.