Os anos passam, mas, em Portugal, subsiste esta tendência tão singular de evitar debater as questões realmente importantes para o nosso futuro, dando primazia à discussão de temas que não justificam qualquer urgência ou não passam de meras tricas partidárias. Como se o facto de este país ter estado três vezes à beira da insolvência financeira, nas últimas quatro décadas, ainda nada nos tivesse ensinado quanto à necessidade imperiosa de uma estratégia para o nosso devir coletivo.
É chocante esta nossa obsessão pelas irrelevâncias que vão alimentando as tertúlias televisivas enquanto persistem sérias incógnitas quanto ao rumo da economia portuguesa. Não basta ouvirmos mensagens positivas do Governo nem sabermos que se mantém um entendimento perfeito entre o Presidente da República e o primeiro-ministro para dissipar legítimos receios sobre o nosso futuro próximo. Receios agravados pelas incertezas em torno da nova administração norte-americana e pelos processos eleitorais que ocorrerão em França e na Alemanha, verdadeiramente decisivos quanto ao futuro da União Europeia.
Por cá, parece estar a esgotar-se a fase eufórica da “devolução de rendimentos às famílias”, que serviu de cimento agregador da maioria parlamentar formada em novembro de 2015. Hoje, Portugal coloca a sua dívida a 10 anos a uma taxa de 4,2% quando, há alguns anos, não excedia 1,5%. Atualmente, o país vizinho pode financiar-se para a mesma maturidade suportando uma taxa de juro apenas de 1,7%, apesar de se ter confrontado nos últimos anos com uma grave crise no sistema bancário e de se ver a braços com sérias tensões separatistas.
Portugal entrou em 2017 com vários sinais de alarme após um ano em que se prometeu mais do que se cumpriu: crescimento anémico, inferior aos 1,6% registados em 2015; dívida pública superior a 130% do PIB; juros da dívida pública a subirem em todas as maturidades. Neste contexto, não surpreende que a quase totalidade das agências de notação mantenha o rating da nossa dívida ao nível especulativo ou de lixo. Ficamos mais do que nunca dependentes da próxima avaliação da DBRS, única agência que nos assegura a via verde para o financiamento externo, sendo abril o mês em que essa dúvida ficará esclarecida.
Torna-se, portanto, imperioso que o País faça um balanço da rota entretanto percorrida, corrigindo erros estruturais e opções estratégicas que já provaram ser um óbvio equívoco. E nem é necessário olhar para longe: basta estudar com atenção, novamente, o exemplo de Espanha, com a sua economia a crescer a um ritmo anual de 3%, quase o triplo da nossa.
Façamos como os espanhóis: concentremo-nos no essencial. Antes que seja a evolução do contexto a despertar-nos, mais uma vez, para essa realidade.