Na entrevista que concedeu ao jornal Público a semana passada, Cavaco Silva diz a dado passo: “Surpreende-me extraordinariamente como é que políticos experientes como Cameron, como Renzi convocam um referendo sobre a Europa”. O que me surpreende é a surpresa do antigo Presidente da República. No fundo é como se Cavaco acreditasse na “experiência” dos políticos como a virtude primeira de quem exerce cargos públicos.

Pela “experiência”, maior ou menor, teríamos garantido, em doses proporcionais, o bom senso, o equilíbrio e a razão das decisões de quem nos governa. Nada mais equívoco. Fosse a experiência um critério de sabedoria política e ela se traduzisse no número de anos em que alguém exerce o poder, o próprio Cavaco Silva estaria entre nós em primeiríssimo lugar. É claro que não faltam qualidades políticas ao anterior Chefe de Estado e à medida que o tempo passa mais Cavaco Silva vai ganhando dimensão histórica. Mas não creio que o seu registo positivo, que o teve, se deva à “experiência” política.

Suponho que a receita está dada, se é que em política se pode falar assim, e foi teorizada há mais de dois séculos. Não são as virtudes pessoais dos políticos, e a experiência ajudará certamente a moldar tais virtudes, que determinam a boa gestão da coisa pública. Exige-se certamente de um político qualidades pessoais e um módico de formação. Mas das virtudes pessoais, ou da falta delas, já os “pais fundadores” americanos teorizaram largamente.

Para prevenir os abusos, o “diabo” das facções e evitar a prevalência do interesse privado sobre o interesse público, que traduz a verdadeira corrupção, as decisões dos políticos têm de ser filtradas pela representação, ponderadas pelo contraditório e argumentadas no contexto dos “checks and balances”. Dirão os mais cínicos que tanta “constituição” não impediu a eleição de Trump. Pois não. Mas vai seguramente correr com ele! Quanto à decisão de Cameron que Cavaco crítica e terá as suas razões, só confirma o que digo. Um experiente e aparentemente bem-intencionado político não é necessariamente um político sábio. Não fosse o respeito da “constituição inglesa” e as virtudes da senhora May de pouco serviriam para transformar o Brexit em algo decente…