É sabido que em Portugal a agenda política e mediática conta, como noutras democracias, com particularidades e complexidades às quais não é isenta a possibilidade de escolha dos envolvidos. Ainda que com “bocados a menos” próprios das “dentadas” que o Estado de Direito tem sofrido no nosso país, há ainda liberdade de imprensa e de escolha. Não são comparáveis as realidades do antes e do depois do 25 de Abril de 1974.

Por tudo isto e por muito mais – como, por exemplo, o acesso massificado a variados meios de informação e a diversas fontes nacionais e internacionais – fiquei surpreendida com o facto de a maior parte dos meios de comunicação calarem a situação grave que ocorre num dos países da União Europeia: mais precisamente na Hungria, mais concretamente envolvendo a Central European University (CEU).

Como universidade de reconhecido valor por entidades universitárias quer na Europa, quer nos outros cantos do mundo, na CEU o rigor e a independência do seu ensino e da sua investigação têm permitido circundar factores que poderiam gerar algum problema e dúvida: ser altamente financiada por Soros e ter que sobreviver num regime de cariz pouco democrático como aquele com que, hoje em dia, a Hungria se debate.

No entanto, as coisas mudaram recentemente. Em Junho, quando tive o prazer de lá estar e de partilhar investigação com colegas das ciências sociais, havia fortes rumores de que esta continuava a ser a casa da liberdade na maravilhosa cidade de Budapeste, não obstante o governo de Orbán pressionar cada vez mais a instituição. Aspecto ainda mais importante dado o ambiente de contínuo esvaziamento democrático a que o país vinha assistindo.

Na verdade, a CEU é uma universidade privada, embora tenha acreditação tanto na Hungria como nos EUA. Aí estudam cidadãos de mais de 100 nacionalidades e, como é de esperar, esta variedade de experiências e culturas traz à capital da Hungria uma dinâmica de abertura e tolerância, o que parece ser mais uma “pedra no sapato” para Orbán.

No passado dia 4 de Abril, a Assembleia Nacional húngara aprovou uma alteração à legislação até aí em vigor que ameaça o funcionamento da CEU. Assim, e por esta via, a CEU terá que mudar a sua designação, depender do governo húngaro para que professores de Estados fora da União Europeia aí possam trabalhar e deixará de poder atribuir graus académicos americanos – hoje possíveis graças à sua dupla afiliação. Isto implica também que a CEU tenha que abrir um campus no estado americano de Nova Iorque.

Todas estas intenções são, pois, fruto de uma pressão política clara e descarada junto da CEU para eventualmente diminuir, retirar e/ou castigar a instituição pela sua posição na defesa dos valores democráticos e da liberdade académica: não sejamos ingénuos em pensar que se trata de outro assunto. E em Portugal o que se fez? Que eu saiba poucos relatos foram assinalados. Infelizmente esquecem-se os esquecidos que estes assuntos não são do céu, mas sim da terra, e que nos afectam a todos.

A autora escreve segundo a antiga ortografia.