Tal como sucedeu em meados de março do ano passado, quando começámos a confinar antes da declaração inicial do estado de emergência, agora começamos a desconfinar antes de levantadas as restrições vigentes.
Os dias de sol são uma tentação para utilizar de forma excessiva as exceções que a lei permite, entre passeios higiénicos, com ou sem bichos de estimação, e de desporto ocasional, junto ao mar ou ao rio, o que contribui para a descompressão de uma tensão que se foi acumulando ao longo das sucessivas semanas de condicionamento.
A tensão que se estendeu aos setores mais restringidos, algumas mais entendíveis que outras, como a restauração, os cabeleireiros ou o comércio de rua, levaram a sinais de resistência, não por manifestantes profissionais, mas por quem se mostra desesperado por querer recomeçar, sem espírito de desobediência, antes procurando salvar o seu futuro, pedindo que os deixem trabalhar.
A pandemia que nos trouxe solidariedade e resiliência mostrou novas formas de trabalho e de prestação de serviço à comunidade, que criou novos espaços de relacionamento social, nem sempre melhores. Mas a paciência tem limites. Enquanto a ciência equaciona todas as variantes de desconfinamento, atingimos a saturação quando os números começaram a descer significativamente. E mesmo perante a iminência de voltarem a subir, ninguém já suporta a ideia de continuar confinado.
Chegámos ao limite. Há 12 meses, ninguém tinha ideia do que enfrentava, agora temos a noção do definhamento da economia, da entropia dos pequenos negócios e dos grandes prazeres sociais, e é chegado o momento de regressar ao tempo anterior, mesmo que reconfigurado. O acesso à “bica” e à “imperial”, duas instituições de peso até agora proibidas clamam por uma nova oportunidade.
Entre cientistas divididos e a pressão social não pode o Governo de António Costa titubear. Não podemos abrir a totalidade das portas à normalidade desejada, mas terão de ser definidas as frestas a abrir no reencontro com a economia, sem questionar a saúde, nem pôr em causa numa quinzena o que se exigiu meses a fio. Janeiro é um exemplo a que não queremos regressar.
Não tardarão as filas matinais à entradas da cidades, o andar apressado para cumprirmos o horário, o desespero para chegar a horas à escola e regressar a um tempo que julgávamos perdido. Não tardaremos a reencontrar os colegas de trabalho que víamos pelos ecrãs. Isto sem perder os novos padrões de reuniões por vídeo, as deslocações digitais. Marcar viagens adiadas mas não esquecidas.
Com isto vai abrir-se um novo mundo de oportunidades. A economia vai soltar-se, o turismo vai começar lentamente a recuperar, os negócios a regressar ao activo. O desconfinamento vai trazer descompressão e ação. Mas será necessário olhar para todos os sinais de estagnação e ajudar a sair dos becos para onde a pandemia nos empurrou.
A partir de agora é tempo de olhar o futuro com otimismo. E não cabe ao Governo travar o que a sociedade quer construir.