“Que adoráveis criaturas aqui vivem! Como é belo o género humano! Ó admirável Mundo Novo, que tem gente assim!” Escrevia estas linhas Shakespeare, na “Tempestade”, em 1611, mas podia tê-las escrito este ano, ao ouvir o recém-convertido europeísta Matteo Salvini, que agora apoia Draghi “incondicionalmente” e diz ter “as mãos, os pés e o coração na Europa”. Isto depois de, em 2017, ter acusado o mesmo Draghi de cumplicidade no “massacre económico da Itália”.

Sobrevivência política oblige, em tempos em que Viktor Orbán e o seu Fidesz deixam o PPE para não serem postos fora. Resta ver quanto tempo vão durar as novas convicções de Il Capitano (Salvini, assim batizado, diz-se, pelas semelhanças com a personagem da Commedia dell’arte).

Os tempos de mudança chegaram também ao Reino Unido, onde Boris Johnson registou o seu primeiro grande sucesso, com a campanha de vacinação contra a Covid (mais de 30% da população recebeu a primeira dose, uma das taxas mais elevadas do mundo). Seguiu-se a saga do Orçamento, que no Reino Unido se executa de abril a março (outra originalidade britânica).

O PIB terá caído 9,9% em 2020, o que constitui a maior queda desde o Great Frost de 1709, quando diminuiu 13% (per capita, 23%). O défice do Estado vai atingir 17% do PIB este ano orçamental e 10% no que se vai iniciar. A dívida pública britânica está em 107% do PIB, uma exposição importante à taxa de juro – atualmente a 0,8% nas obrigações do Tesouro a 10%, um nível historicamente baixo; por cada ponto percentual de aumento é 1% do PIB que vai para pagar juros.

Rishi Sunak está, então, atento aos sinais de subida da inflação e das bolsas, até porque só a meio de 2022 o Reino Unido vai recuperar da crise. Nesse ano o Governo conservador vai fazer o contrário do que lhe é habitual, subir os impostos sobre as sociedades (de 19% para 25%) e não atualizar escalões, para reduzir a dívida. Para já, em janeiro deste ano Londres deixou de ser a maior praça financeira europeia, lugar que deixou a Amsterdão.

Na Alemanha vamos ter a substituição de Merkel. Este fim de semana é o teste a Laschet, com eleições na Turíngia e em Bade-Vurtemberga. Em circunstâncias menos boas, depois de dois deputados CDU/CSU surgirem envolvidos em negócios de máscaras com fundos públicos, o que prejudicou a imagem do partido.

Mas a maior mudança vem do Oriente. Na China, que Blinken – o Secretário de Estado de Biden – considera o “mais importante teste geopolítico do século”, é o ano do novo Plano Quinquenal, e que se prevê (sem risco) ser aprovado por unanimidade. Vai assentar no conceito de “circulação dual”: tornar o país tecnologicamente independente e fazer o crescimento assentar na procura interna e substituição de importações. O objetivo é simples: tornar a China a primeira economia mundial no horizonte de 2030. Se resultar, vai deixar-nos com os olhos em bico.