Os movimentos de cidadãos independentes têm, nos últimos anos, ganhado projeção na Europa.

Em Espanha, as duas principais Câmaras do país, Madrid e Barcelona, são desde 2015 governadas por duas independentes, respetivamente Manuela Carmena e Ada Colau, fenómeno só comparável a Rui Moreira, atual presidente da Câmara Municipal do Porto. O nacionalista cívico Pawel Kukiz, na Polónia, e Beppe Grillo na Itália têm-se batido, com sucesso, por colocar cidadãos comuns no poder e estabelecer uma democracia direta através das redes sociais. Também ao nível presidencial sopram ventos de mudança. Em França, Macron, o candidato independente e antissistema, foi eleito com votos de todo o espectro e, em Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa foi o único candidato presidencial verdadeiramente independente da história democrática.

Estamos a viver tempos de mudança e a clássica divisão entre esquerda e direita, originária da Assembleia dos Estados Gerais, está cada vez mais desatualizada. Mas o descrédito dos partidos tradicionais e a desconfiança nos seus agentes não têm sido ainda suficientemente impulsionadores da reforma do sistema político, uma reforma audaz e diferenciadora capaz de romper com o establishment, sendo o crescente abstencionismo da sociedade civil um fator, também ele, inibidor da mudança.

Contudo, a progressiva desideologização na política, com um sistema em profunda crise, potenciará a longo prazo cada vez mais movimentos desta natureza, embora em Portugal possam revelar-se um problema pela ausência de clareza das alternativas programáticas ao centro do espectro. Também as “listas de cidadãos” poderão trazer maior concorrência e legitimação políticas, permitindo uma fragmentação saudável, sobretudo num dos sistemas menos fracionados da Europa, como o nosso, com um formato quase bipartidário.

A democratização dos processos de escolha dos deputados e a possibilidade das bases poderem escolher os seus representantes em eleições primárias abertas, representam duas preocupações urgentes a ter em conta no atual contexto político-partidário. Não há dúvida de que a cidadania é benéfica para a regeneração democrática e incentiva a entrada de pessoas na vida política ativa que, de outra forma, não se sentiriam motivadas a fazê-lo, designadamente por terem carreiras profissionais incompatíveis com a longa ascensão partidária.

Como dizia Carmena na sua tomada de posse: “Queremos governar ouvindo, que nos chamem pelo nosso primeiro nome, que nos twitem…”. Este será, com certeza, o segredo da práxis com que se conseguirá ganhar votos num futuro cada vez mais próximo.