Os serviços energéticos são muitas vezes de complexa perceção para os cidadãos, deixando escondidas atrás de tecnicismos decisões que podem afetar decisivamente os consumidores e as empresas. As políticas públicas são feitas de opções e escolhas e, em democracia, o escrutínio das decisões é uma necessidade a fim de garantir a transparência dos processos.
A atual legislatura permitiu que o Parlamento tenha ganho centralidade na discussão energética. Os planos de investimentos na rede, ao passarem obrigatoriamente a ser discutidos e aprovados pelos parlamentares, são disso exemplo. Esta medida visa defender os consumidores, as empresas e o interesse público.
As remunerações desses investimentos devem ser as adequadas, mas sem esquecer os princípios da coesão territorial, nomeadamente dos territórios de baixa densidade populacional.
Outro debate fundamental são as renováveis. Portugal é um exemplo a nível europeu no aproveitamento de fontes renováveis e na descarbonização da economia, mas essa aposta na sustentabilidade ambiental não pode ser feita com acréscimo de custo para os consumidores, sendo que os promotores devem encontrar a sustentabilidade financeira dos seus investimentos. Este é um dos principais desafios do futuro, assim como aumentar os níveis de eficiência energética no nosso país, ainda muito longe do adequado.
Por outro lado, os custos energéticos continuam a ter um enorme impacto nas famílias e nas empresas. No entanto, no último ano, assistimos a uma baixa no gás natural na casa dos 20% e na eletricidade abaixo da taxa da inflação. Ao nível de preços foi possível atuar sobre os setores mais frágeis da nossa sociedade através da Tarifa Social que chega a mais de 800 mil famílias, possibilitando milhões de euros de poupança àqueles consumidores que mais precisam.
Contudo, existe um setor onde ainda muito está por fazer. O gás de botija, que ainda hoje serve 75% da população, não segue esta tendência de baixa. Este mercado complexo foi alvo de um estudo da Autoridade da Concorrência, a pedido do Governo, e as conclusões sobre as suas disfuncionalidades e dificuldade da concorrência devem preocupar todos.
A alteração do quadro regulatório do “gás de botija”, presente no último Orçamento do Estado, é relevante, mas a sua passagem para a ERSE não resolverá todos os problemas. É necessário defender o interesse público e dos consumidores nesse mercado.
Portugal tem pela frente muitos desafios energéticos no futuro, nomeadamente o de conseguir, em conjunto com Espanha, que a Península Ibérica deixe de ser uma ilha. A França deve ser obrigada pela União Europeia a cumprir os princípios europeus e a garantir a interconexão com Espanha e Portugal. Este é o desafio de futuro de um país que soube dizer não ao nuclear e está no topo da descarbonização e da não dependência de combustíveis fosseis para a produção de energia.