Eleições sempre me fascinaram. Não apenas por serem o expoente da democracia, mas sobretudo pelas suas pequenas histórias e os seus grandes mistérios. Por exemplo, na primeira volta das eleições francesas houve uma centena de candidatos que não tiveram nenhum voto. Como foi possível? Nem eles próprios votaram em si? Em quem é que votaram? E porque é que se candidataram? Outro mistério eleitoral são os quase três milhões de eleitores que apareceram no Reino Unido no referendo do Brexit e que ninguém sabe quem são, donde vieram, onde estão e o que andaram a fazer antes do referendo. A única coisa que sabemos é onde votaram, mas se hoje ainda lá estão é outro mistério, até porque metade deles já desapareceu outra vez nas eleições deste mês.

E destas eleições britânicas há outras histórias engraçadas. O senhor Gavin Barwell ganhou as eleições na circunscrição de Croydon Central no escrutínio de 2015, e escreveu um livro de título “How to win a marginal seat”, por sinal muito interessante. Entre outras coisas explica que os “marginal seats” são aqueles que decidem eleições, pois nos outros já se sabe há anos quem ganha – a vantagem que determinado partido tem é tal que vence de olhos fechados. É, portanto, nas circunscrições “marginais” que o esforço compensa, e Barwell explica com bastante cuidado como se deve “investir” nestas circunscrições para que, como ele fez, se consiga ganhar, no caso por 600 votos. Confesso que não acabei de ler o livro, porque ele perdeu o seu lugar de deputado nas eleições deste ano por mais de 5000 votos, o que me fez perder o entusiasmo pela leitura. Resolvi esperar pelo seu próximo livro, “How to loose a marginal seat”, para saber o que não se deve fazer. Confesso que suspeito que a resposta é convocar eleições antecipadas, algo que ele só desculpa à senhora May porque ela acabou de o nomear chefe do seu gabinete.

Voltando a França, o mistério para a segunda volta das legislativas foi esta coisa de, na 18ª circunscrição de Paris, Macron apoiar Myriam El Khomri e o seu primeiro-ministro apoiar Pierre-Yves Bournazel, o que desde logo levanta a questão de qual dos dois, El Khomri ou Phillipe, é mais “macron-patível”. Esta aposta do Presidente e do seu Governo em dois candidatos diferentes é, por um lado, como jogar com uma tripla – de certeza que não perdem. Mas, por outro lado, isto de ao mesmo tempo apoiarem uma socialista e um republicano talvez seja bom para a igualdade dos géneros, mas é uma espécie de geringonça.

 

Nota biográfica: Hemp Lastru (n. 1954, em Praga) é sobrinho neto de Franz Kafka. Democrata convicto, ativista e lutador político, é preso várias vezes pela polícia secreta checoslovaca, tendo sido sentenciado em 1985 ao corte de uma orelha sob a acusação de “escutar às portas”. Abandona a política em 1999, deixando Praga para residir em Espanha. Mudou-se para Portugal em 2005 porque “gostaria de viver num país onde os processos são como descrevia o meu tio-avô nos livros.”