(O tradicional disclaimer: na praia de Porto Santo, ilha em que o tempo corre sempre mais devagar e os jornais, com sorte, chegam no dia a seguir, fui lendo, entre a náusea e o sorriso irónico, desde as explicações sobre o material de Tancos, em relação ao qual ainda iremos descobrir que o seu furto se tratou de favor ao Estado Português, a Pedrógão, cuja tragédia fez renascer das cinzas uma inusitada “investigadora”, cujas principais habilidades parecem ser insolver as suas próprias empresas. Escolhi Bava e as alegadas declarações que terá, segundo se diz, prestado ao Ministério Público, numa clara homenagem à designada silly season, em que os parvos, desta feita, parecemos ser nós.)
A peculiar gestão da Altice na PT, caracterizada tanto pelo abuso de mecanismos legais criados para proteger os trabalhadores, designadamente no que se reporta à transmissão do vínculo para outras sociedades, sem património conhecido, como pelo assédio moral, só surpreende os mais incautos, na medida em que já tinha sido posta em prática por este mesmo grupo na Cabovisão e na ONI. Sejamos claros, portanto: a única diferença no que agora se publicita é o número de trabalhadores abrangidos. Dir-se-á até mais: tal manobra foi, justamente, a que foi efectuada pelo próprio Estado, aquando da venda do BPN ao BIC, permitindo-se a este último escolher os trabalhadores que queria e atirando-se com os demais para uma empresa criada para receber os activos tóxicos, sob o permanente espectro de que iriam ser despedidos a qualquer altura. Nada disto é novidade, assim como, também nesta sede, a verificação da velha máxima de que, afinal, a factura é paga pelos mesmos de sempre.
O que, nos últimos dias, assumiu contornos absolutamente pitorescos foi, a ser verdadeiro, o conteúdo das explicações dadas por Bava, esse condecorado farol da gestão, quanto aos mais de 20 milhões de euros que terão sido colocados à sua disposição e em relação aos quais decidiu apenas devolver uma parte. Segundo Bava, destinavam-se a investir na própria PT, como se a coisa mais normal do mundo fosse um accionista fazer transferências de milhões, cuja proveniência era já então mais do que duvidosa, para uma conta, sem um único documento escrito e sem que lhe fosse pedida uma única justificação. É certo que Bava era, então, o menino de ouro da gestão, aclamado por quase todos, excepto pelos que ousaram interrogar-se sobre algumas das suas escolhas. O que ficámos agora a saber é que, segundo o próprio, era simultaneamente o million dollar man, fiel guardador do dinheiro dos outros, o qual só parcialmente devolveu por razões de “segurança jurídica”. Na prática, segundo se percebe, Bava era uma espécie de banco, por cujas práticas, também, pagam os trabalhadores da PT.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.