A imagem de um hemiciclo vazio durante importantes debates para a Nação, tem-se tornado uma triste constante nos últimos anos. Mas as faltas dos deputados nunca fizeram com que algum tivesse perdido o seu mandato e têm-se sucedido ao longo dos anos com total impunidade. Os exemplos são inúmeros, desde ausências por ser vésperas de Páscoa e de feriados até àquelas para assistir à final da Taça UEFA de futebol.

A acumulação de funções é, porém, uma das razões que mais influi no défice de comparência parlamentar. Muitos deputados exercem várias atividades ao mesmo tempo e o desdobramento para acorrer a todas inviabiliza-lhes um bom desempenho em cada uma delas. Há pouco tempo ficou célebre a frase da atual candidata do PSD à Câmara Municipal de Lisboa – Teresa Leal Coelho: “não faltei, fiz-me substituir”. Por somar as funções de vice-presidente do PSD e deputada, enquanto vereadora, Leal Coelho a cada três reuniões do executivo camarário faltou, geralmente, a duas. Ora, os agentes políticos que dividem o seu tempo entre várias competências, não servem com rigor os interesses do eleitorado e, por consequência, têm prestado um mau serviço à democracia representativa.

Os escândalos das faltas cometidas por deputados levou a que, em 2003, se alargassem regimentalmente as justificações para as mesmas. Por razões exclusivamente de solidariedade corporativa foi, por isso, criado um grupo de trabalho na Assembleia da República para branquear um problema que se tornara cada vez mais incomodativo nos media e passou a poder invocar-se até hoje “força maior” e “trabalho político” no elenco dos motivos das ausências. Estas são expressões juridicamente porosas cuja extensão se afigura incerta e dúbia, não permitindo uma comunicação inequívoca quanto ao seu alcance. Nunca ninguém se responsabilizou pela ausência em debates cruciais para o país nem sequer foram apresentadas, alguma vez, desculpas públicas por algum grupo parlamentar.

Numa época em que se debate tanto o Estado útil, não seria altura de mostrar coragem e alterar o regimento da Assembleia da República, inviabilizando justificações intempestivas de faltas e escrutinando com provas irrefutáveis os motivos das ausências? Enquanto não se apertarem as malhas da rede da lei e continuarmos a compactuar com facilitismos corporativos, não conseguiremos elevar o nível daqueles que elegemos para nos representarem.