O crescimento económico que hoje se verifica em Portugal encontrou um inesperado obstáculo: a falta de capital humano. Apesar do desemprego elevado, as empresas deparam-se com uma escassez de recursos humanos adequados às suas necessidades, sendo esta dificuldade ainda mais aguda em setores muito especializados e em zonas de baixa densidade populacional.
O défice de recursos e competências não é sentido unicamente ao nível da oferta de quadros nas áreas tecnológicas e de engenharia, cujo know-how se afigura indispensável numa economia cada vez mais dinâmica e digital, mas é transversal a quase todos os setores.
Hoje existe uma enorme dificuldade no recrutamento de profissionais, especializados ou indiferenciados. Nas áreas tecnológicas, vemos com grande orgulho o país a ser escolhido por grandes multinacionais para instalarem em Portugal os seus centros de engenharia, inovação e competências. Assistimos ainda ao reforço do investimento das empresas nacionais nestas áreas de conhecimento e especialização. Contudo, a capacidade de angariação de quadros técnicos tem-se agravado substancialmente. Por um lado, porque muitos saíram do país desde o início da crise, em busca de melhores oportunidades, inclusive fora da sua área de formação. Por outro lado, porque a procura claramente excede a geração de profissionais por parte das universidades, criando um grande entrave à operacionalização dos investimentos.
Não obstante a falta de recursos de elevada formação educacional, a agravar-se futuramente, hoje existe igualmente um grande défice de recursos operacionais, do chão de fábrica, que foram muitas vezes desconsiderados e hoje são o coração dos grandes campeões da recuperação económica nacional e das exportações, como o Têxtil, o Calçado, a Metalomecânica, a Cortiça, o Turismo, a Agricultura, etc.
Falo de uma grande escassez de técnicos profissionais, como soldadores, serralheiros, operadores de máquinas, e inclusive indiferenciados, que com formação dada pelas empresas podem desenvolver a sua carreira com sucesso. Ora este cenário põe em causa a viabilidade de investimentos estruturantes, ameaça o crescimento do volume de negócios das empresas, coloca em risco a modernização tecnológica do tecido produtivo e impede o aumento da produtividade e competitividade do País.
De resto, a nossa economia está entre as que apresentam um maior desequilíbrio de competências. Na 5.ª edição do Hays Global Skills Index 2016, Portugal é apontado como o quarto país, entre 33 economias globais, com o maior desfasamento entre as competências dos recursos humanos disponíveis e as necessidades de qualificação profissional das empresas.
É verdade que, nas últimas décadas, assistimos em Portugal à expansão do ensino superior, ao aumento da escolaridade obrigatória e ao crescimento da formação profissional. Contudo, esta dinâmica tem-se revelado insuficiente, e em alguns casos inclusive contraproducente, para uma convergência real com as economias europeias mais avançadas.
A Portugal não basta manter a trajetória atual: é necessário acelerar o ritmo e aumentar a abrangência da qualificação humana, para que a convergência com o resto da Europa se concretize efetivamente. Ora, isto exige o combate ao abandono escolar precoce, a dinamização do ensino tecnológico e profissional, a expansão da formação para adultos, o incremento da reconversão profissional de licenciados, o incentivo à qualificação dentro das empresas e o reforço das áreas tecnológicas no ensino superior.
Um país não vive só de doutores e engenheiros, que com toda a competência formamos e dos quais necessitamos. Porém, com grande falta de visão estratégica, Portugal acabou com o ensino tecnológico e profissional, que é de elevada importância para o seu desenvolvimento por alimentar o tecido operativo e fornecer aos estudantes formação técnica especializada, com uma forte vocação profissionalizante e muito orientada para as empresas. Este tipo de ensino deve, pois, ser uma aposta imediata, incentivado entre os jovens, na medida em que alarga as suas saídas profissionais (sem hipotecar o acesso à universidade) e, ao mesmo tempo, vai ao encontro das necessidades de pessoal especializado das empresas, sustentando o crescimento económico e industrial nacional.
Também a qualificação profissional dentro das empresas potencia as capacidades e competências dos recursos humanos, possibilitando ganhos ao nível da produtividade, da qualidade de bens e serviços, da organização empresarial, do tempo de resposta a encomendas e da modernização tecnológica. Neste sentido, devem ser criadas condições para que as empresas promovam mais ações de qualificação em contexto de trabalho, de modo a que os seus recursos humanos fiquem melhor preparados para responder às necessidades reais de produção.
Simultaneamente, há que sensibilizar os jovens para as vantagens de uma carreira nas áreas tecnológicas, cujos cursos superiores não revelam a procura desejada. É necessário, para isso, tornar os programas de estudo das áreas tecnológicas mais atrativos e orientados para as empresas.
Desafio o país a pensar este tema de forma estratégica e estruturante, tendo em consideração a importância do mesmo, nomeadamente porque este será um dos grandes entraves à expansão e ao crescimento económico nacional das próximas décadas.