Numa altura em que o populismo penal ganhou direitos de parangonas a propósito das declarações polémicas de um candidato autárquico, recomeçou em Portugal a discussão sobre a pena de morte.

Temos uma tradição humanista e de vanguarda na defesa dos direitos humanos. Embora não tenhamos sido os primeiros no mundo a abolir a pena de morte, como erradamente se faz correr, pois à nossa frente vieram a Venezuela, San Marino e o Michigan, fomos pelo menos, o primeiro Estado a inscrever essa proibição na Constituição. Na Europa, a Bielorrússia é o último país a aplicá-la e não é por acaso. É uma das nações europeias onde se vive uma crise mais profunda a nível económico, social e moral. A catarse experimentada através deste expediente permite canalizar as energias revanchistas da comunidade. Mas os movimentos radicais têm vindo a pôr o assunto novamente em cima da mesa e logrado a adesão de cada vez mais seguidores. Tema que vem associado a fenómenos como a Frente Nacional, o Estado Islâmico e seitas religiosas partidárias do extermínio de determinadas etnias.

A razão de ser de recolocar esta questão na ordem do dia reflete a necessidade de encontrar um bode expiatório para quem não quer resolver os verdadeiros problemas e, em vez disso, pretende desviar as atenções para o que dá votos imediatos. A justiça humana tem os seus limites consagrados na conquista da inviolabilidade do direito à vida e na dignidade da pessoa. Pelo que a pena de morte não só traduz um retrocesso civilizacional como prossegue uma lógica errada de incitação da violência com mais violência. A crença indelével na teoria da vingança da justiça penal, que existe na maior parte dos países do mundo em contraponto com a teoria da reabilitação do condenado, tem conduzido a resultados muito negativos na regeneração dos criminosos.

A taxa de reincidência de prisioneiros libertados na Europa em média é de 55% enquanto na Noruega é de 20%. Aliás, nos países escandinavos, onde o sistema prisional é mais dignificante, o objetivo é proporcionar ao recluso condições de inclusão uma vez retornado à sociedade. Por isso, independentemente da natureza dos crimes praticados, os programas de reabilitação devem ser rigorosos e implacáveis. Está provado que um preso que dentro das instituições prisionais goza de um sistema progressivo de benefícios em função da evolução do seu desempenho integrativo, tem muito mais probabilidades de sair reabilitado do que aquele a quem são infligidos castigos e está destituído, no cárcere, das condições mínimas de dignidade.

Portugal deve manter-se fiel à promoção dos valores da Cidadania Europeia e à construção de uma identidade baseada nos princípios da tolerância, respeito e liberdade. Como disse Vítor Hugo acerca da vocação clemente de Portugal: “(…) proclamar princípios é mais belo ainda que descobrir mundos.” É nosso dever continuar a proclamá-los.