Tudo indica que 2017 será novamente um ano recorde em termos de venda de veículos elétricos – não só em Portugal como um pouco por todo o mundo. Só no primeiro semestre deste ano foram vendidos mais de 900 veículos elétricos em Portugal, quase Cinco vezes mais do que os vendidos em todo o ano de 2014. Apesar de estarmos a falar ainda em números relativamente pequenos, o crescimento das vendas tem tido taxas elevadas. A crescente oferta no mercado, os incentivos fiscais existentes ou a existência de uma rede nacional de carregamentos elétricos têm contribuído para tal.
Lá por fora, os países nórdicos estão na linha da frente na Europa (em especial a Dinamarca), com os mercados chinês e norte-americano a serem os mais significativos em termos de volumes de vendas. Assim, podemos dizer que, mais do que uma “moda”, os veículos elétricos são já uma realidade incontornável, apesar de haver ainda alguns (incluindo na classe política) que não entendem o seu alcance e impacto.
Os veículos elétricos têm de ser vistos num enquadramento mais vasto de mobilidade sustentável e de combate às alterações climáticas. Dadas as evidências do impacto negativo dos transportes a combustão sobre o ambiente, há um consenso (quase) generalizado de que é necessário um novo paradigma de mobilidade nas cidades, assente em tecnologias limpas e com o menor impacto nos territórios.
Os veículos elétricos (tal como outros não emissores de poluição) são um instrumento essencial nesse paradigma. Foi neste sentido que nos últimos meses várias cidades europeias e países a nível mundial decidiram tomar medidas para banir os automóveis a combustão dentro de alguns anos. Na Europa, a Alemanha é um dos casos mais significativos, dado ser um dos principais produtores de automóveis, mas também a França e o Reino Unido. Na América Latina, os BRIC, liderados pelo Brasil, avançam no mesmo sentido, enquanto que na Ásia, a China (um dos principais países poluentes a nível mundial) quer apenas motores elétricos nas estradas dentro de duas décadas.
Face a estas orientações políticas (mais uma vez, é a política pública a fazer opções – e bem), qual tem sido a posição dos construtores “tradicionais”, os principais afetados por esta “onda ecológica”? Aparentemente, quase todos os fabricantes de automóveis a combustão têm apostado em incluir nas suas ofertas automóveis elétricos – ou versões de modelos existentes (como o VW Golfe) ou modelos totalmente novos (como o Nissan Leaf). E as propostas para a próxima década consistem em apostas fortes na oferta elétrica, incluindo nos segmentos topo de gama (como na Mercedes, BMW ou a Jaguar). Por exemplo, a VW – muito devido à descoberta do esquema fraudulento do “Dieselgate”, que prejudicou milhões de consumidores – prevê um investimento de cerca de 70 mil milhões de euros na “eletrificação” da sua produção, incluindo a produção de veículos elétricos, fábricas, infraestruturas de carregamentos e baterias.
Verifica-se, portanto, um alinhamento de expetativas e de estratégias dos fabricantes automóveis com as orientações e decisões políticas em curso a nível mundial. A única exceção é a do grupo PSA, liderado pelo português Carlos Tavares, que afirma não ser prioritária a produção de veículos elétricos (esta afirmação não deixa de ser surpreendente, dado o seu percurso anterior pela aliança Nissan-Renault, líder na produção de veículos elétricos).
E qual o papel de Portugal no meio destes factos? Diria que estes movimentos constituem uma oportunidade para posicionar o país na vanguarda da mobilidade sustentável. É preciso relembrar a aposta política nesta área, que ocorreu na década passada, e que levou a que Portugal tenha sido pioneiro em termos de mobilidade elétrica, com a criação de uma rede nacional de carregamentos (Rede Mobi.e, agora em atualização).
Pelo meio, desenvolveram-se competências e serviços associados à mobilidade sustentável – atualmente exportamos carregadores para veículos elétricos (ex. EFACEC, Magnum Cap), sistemas de gestão de soluções de mobilidade (CEiiA) e até produzimos veículos elétricos (eCanter, da FUSO/DAIMLER). Além disso, as nossas cidades têm já Planos de Mobilidade Urbana Sustentável, que poderão estimular casos de boas-práticas na adoção de soluções deste tipo e que podem ser replicadas internacionalmente (como no Porto, Lisboa ou Cascais).
As oportunidades para Portugal estão assentes na consolidação da experiência e conhecimentos adquiridos ao longo da última década na área industrial, mas também na exploração económica dos recursos naturais (como o lítio) ou na valorização da investigação que se faz nos nossos centros de I&D, que deu origem a startups como a VENIAM, uma das empresas mais disruptivas do mundo em serviços de mobilidade.