Na Portela, o André Ventura é o putativo autarca mais badalado dos últimos 20 anos. Por causa dos ciganos. Ninguém na Portela ligava muito às autárquicas porque estavam sempre perdidas para a esquerda socialista primeiro, hoje para o Partido Comunista, ainda que com um comunista bastante aceitável chamado Bernardino Soares.
A Portela de Sacavém é a única freguesia de direita de Loures. Calha que vivi lá grande parte da minha vida, por isso ensaio aqui o retrato de uma população que é bastante próxima da ideal: um universo de 15 mil pessoas, formação superior na geração dos millennials, classe média de rendimento (pobre em qualquer outro país da Europa desenvolvida). Foi inicialmente povoada com os chamados retornados, a segunda e terceira geração foram por lá ficando.
A única vez que a Portela se indignou e saiu às ruas para fazer o seu 25 de Abril, foi quando a Câmara teve a veleidade de querer alojar provisoriamente os indignos cidadãos de Camarate – ciganos lá bem no meio, nas instalações de uma escola que hoje já não existe. Foi ver casais enfurecidos a gritar. Funcionou.
Dá-se o caso de André Ventura pertencer ao PSD, mas a um PSD diferente. Porventura o mais populista e vazio da sua história, cujo legado que lhe reconhecem é ter posto um limite aos banqueiros e às famílias ricas “que se aproveitaram” do país. Passaram três anos e o Novo Banco arrisca não ter comprador tal foi o rol de asneiras que a coligação cometeu em benefício desse bem maior que era purificar o capitalismo. E misturo estes dois casos porque na sua génese está a razão pela qual os populismos nascem. O PSD dos valores sociais-democratas não falaria de ciganos. Falaria de todos os casos – étnicos ou não – em que há atribuição indevida de fundos do Estado e dos contribuintes. Saberíamos que estavam lá incluídos os ciganos, mas o dever da retórica política é um dever de sociedade. E não é esta que queremos.
O PSD social-democrata não proporia formação obrigatória em Direitos Humanos, Direitos das Mulheres e Direito Penal a ciganos. Diria que qualquer cidadão com residência permanente em Portugal está obrigado às regras previstas na nossa Constituição e às demais comummente aceites pela nossa sociedade.
Numa democracia sã, quando um qualquer partido, PSD ou outro, falhasse com estes desígnios, outros partidos moderados, equilibrados e fiáveis tomariam o seu lugar. Na ausência deles, há André Ventura. Há Bloco de Esquerda e Partido Comunista. Na Europa, há a extrema-direita de novo no Parlamento alemão. E nas urnas há uma classe média formada que está a aplaudir o André Ventura.