Não é raro ficarmos desapontados com o estado do nosso Estado, da democracia portuguesa e com as andanças que o país vai fazendo. Não é igualmente raro que o pessimismo nos invada quando há suspeitas e/ou provas contra alguns políticos que deveriam primeiramente defender o bem comum e não o seu próprio. Não é, de todo, comum darmos uma vista de olhos pelos jornais e não pensarmos que os populismos para os quais algumas democracias nos têm empurrado colocam em causa os ideais democráticos. Todavia, este pessimismo generalizado e, diria mesmo, fundamentado com casos exemplares, nem sempre tem razão de ser.
Tendo estas dúvidas em mente fui consultar os índices do Global State of the World Democracy, recentemente disponibilizados online. Em termos globais, se bem que falamos de médias, o cenário não é tão assustador como poderíamos pensar à partida. Os dados em causa cobrem algumas décadas (1975-2015) e dividem-se em vários indicadores agrupados em cinco atributos gerais: Governo Representativo, Direitos Fundamentais, Controlo do Governo, Administração Imparcial e Compromisso Participativo. De acordo com esta informação, a Democracia no mundo tem-se desenvolvido e tornado mais estável nestes últimos 40 anos. Portanto, existe, em termos globais, um progresso significativo a este nível.
A qualidade das eleições, os controlos aos governos, o número de eleições e os direitos fundamentais têm aumentado positivamente, apesar de haver (sobretudo neste último indicador) grande variação quando comparados países bastante dissimilares. Também ao nível da participação política os valores para o mundo são bastante positivos em termos de evolução. Valores não tão positivos têm sido os respeitantes à corrupção. Este índice tem-se mantido estável, ainda que seja difícil autonomizar esta medida já que agrega aspectos que nem sempre se direccionam para a corrupção por si só, mas para uma administração menos eficiente. Isto é, a corrupção e o seu estado é por essa via medida indirectamente.
Mas então e Portugal? Se olharmos para os dados e os compararmos quer com as médias dos países do Sul da Europa, da Europa e depois do mundo, não estamos mal classificados. No posicionamento geral para o mundo e dado as diferenças globais estamos muito acima da média em termos qualitativos, o que não é de espantar, mas comparados com o Sul da Europa estamos melhor e o mesmo acontece com as médias para a Europa. Estes valores são mais interessantes de analisar a fundo e de nos fazer pensar. Os itens que nestes 40 anos apresentam mais oscilações são os relativos à participação eleitoral, o que terá diversas causas que aqui não temos espaço para desenvolver, mas que, não surpreendentemente, não estão muito longe do que acontece noutras democracias consolidadas.
A Democracia como a conhecemos é um ideal, e como tal está sempre incompleto. Convém continuar a desenvolvê-la e a melhorá-la, caso sejam os valores democráticos que defendemos, convém “não dormir na formatura”, mas o alarmismo das mudanças bruscas só pode e deve ser feito com dados mais específicos e com uma clara tentativa de “ver à lupa” causas e consequências nefastas para as nossas sociedades. Com isto não quero dizer que não devemos alertar para os perigos que vemos surgir, contudo, tenhamos em conta a história do Pedro e do Lobo.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.