Quando decidi mudar de vida e de profissão e lançar-me no difícil mundo da restauração, mesmo já tendo uma família experiente no ramo por trás, foi um choque inesperado. Decidira no ano de 2018 que queria tentar uma nova aventura no mundo gastronómico da cozinha da terra dos meus pais. Meses à procura do espaço ideal, a reabilitá-lo, a implementar o conceito, enquanto alternava entre o entusiasmo e o medo, entre a motivação e o desânimo. O interesse pela cozinha libanesa e a curiosidade pelo conceito, muito personalizado, despertou a curiosidade de muitos e tivemos um fantástico primeiro ano de abertura.
Ainda tive a felicidade de conhecer a vida de um restaurante a funcionar em pleno durante 1 ano e quatro meses, até que chegou 16 de março de 2020 e entrámos no primeiro confinamento. Esse primeiro estranho confinamento que nos diziam que iria durar apenas 2 semanas, depois 3 semanas, depois afinal 2 meses. Ninguém está preparado para enfrentar circunstâncias fora do seu controlo e que lançam o caos na sua vida. O medo contaminou tudo, o medo pelo desconhecido que prendeu as pessoas às suas casas, como num filme de ficção científica pós-apocalíptico.
A reabertura foi dolorosa e demasiado lenta e o mundo permaneceu suspenso ainda por um longo tempo até que chegou o verão. Já havia notícias de vacinas em produção, as pessoas aproveitavam as férias para regressar às suas atividades favoritas com alguns cuidados e voltou a surgir a esperança de que a situação estaria sob controlo. Ainda sabíamos demasiado pouco sobre a evolução de pandemias.
No outono de 2020, foi bom ver as caras familiares dos clientes a regressarem e contentes por termos aguentado o embate. Estávamos de volta, até que uma das novas mutações do vírus nos fez aperceber de que os confinamentos apenas têm o poder de abrandar a circulação exponencial do vírus. Foi um inverno de recuo e desilusão, com uma situação financeira já bastante precária.
O segundo confinamento, decretado em janeiro de 2021, foi definitivamente pior e foi só nessa altura que surgiram as vacinas e os apoios a fundo perdido, do Estado e Câmara, como um colete salva-vidas, no momento em que estamos prestes a afogar. Nesse confinamento mantive-me aberta (em regime take-away), habituando-me às viagens solitárias pelos transportes públicos e a caminhar por ruas semi-desertas, com poucos contactos sociais.
A reabertura foi mais rápida após o fim do Estado de Emergência e prometiam-nos um verão de recuperação e esplendor que só aconteceu para os que tinham esplanadas. Mais um outono de falso arranque, mais um inverno de recuo e contenção. Houve de novo más decisões, novas mutações e a sensação de dèjá-vu. Senti que a saúde mental começou a ceder, ainda mais, um pouco por todo o lado.
Esta aventura tinha tudo para chegar a bom porto, mas somos ultrapassados pelas circunstâncias. Tornou-se um fardo mental insuportável. Não é a crónica mais otimista para ser ler no dia de Natal, mas o novo ano que chega promete ser outro longo arrastar pandémico, enquanto o mundo se revolta cada vez mais, inundado de desinformação e caos. Quero ainda acreditar em finais felizes, mas, entre os meus clientes e eu, já há muito tempo que ecoa o mantra “um dia de cada vez”.